sexta-feira, 26 de março de 2021
O tempo era de abobora
O tempo era de muita abobora. Os quilombolas de Jaguarana, município de Colinas, transportavam sua produção em cima do lombo de jumentos e a jogavam a beira da estrada de piçarra que liga o quilombo ao asfalto. As aboboras se amontoavam em vários pontos o que podia transparecer que ninguém as queria. Na verdade, um caminhão as buscaria para leva-las aos mercados consumidores. Os preços pagos pelos comerciantes aos quilombolas variam para baixo. Isso decorre pelo excesso de produção e por não haver outros compradores interessados em comprar a abobora. Um desses montes de abobora pertencia a dona Regina, presidente da associação dos moradores de Jaguarana. Ela também é professora do município de Colinas, função que exerce desde 2002 ano em que prestou concurso e pelo qual foi selecionada. Na sua juventude, Dona Regina só foi duas vezes a cidade de Colinas. A distancia de Jaguarana a Colinas perfaz mais de trinta quilômetros. Se não era fácil sair de uma comunidade rural e ir estudar na cidade, imagina sair de uma comunidade negra e pobre. O Ironis, presidente do quilombo Peixes, explicou que uma das formas de endividar os mais pobres e os negros era oferecer transporte numa situação de extrema dificuldade. Uma forma de pagamento era entregar um pedaço do terreno ao motorista. Os quilombolas tiveram que sujeitar a esses termos de cobrança se não a pessoa adoecia e morria na comunidade sem assistência medica. De terreno em terreno, o grileiro/motorista ergueu uma fazenda de milhares de hectares em cima da comunidade quilombola de Peixe fazenda esta que seu filho vendeu partes para plantadores de soja. A Dona Regina enfrenta situações parecidas em seu território da Jaguarana e também envolve plantadores de soja. Jaguarana é um assentamento do Incra mas no final das contas é um quilombo onde é vedado a venda de terras para pessoas de fora do quilombo. O quilombo é um território tradicional onde se respeita as relações tradicionais de cultura produção e de família. A entrada de plantadores de soja no território Jaguarana e em outros territórios tradicionais implica na subversão dessas relações e na incorporação de valores alheios a comunidade.
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