Joedson pede que comente uma foto
que inserira no facebook: ”Escreve algo que explique a situação pela qual passa
a família do Vicente.” Em primeiro plano, o Artur, ou “rei” Artur, sobe (?) a
mureta que separa a casa onde a família dorme do puxadinho onde a família cozinha
as refeições (café, almoço e janta). O rosto do “rei” Artur é fechado. Ele não
divide a brincadeira portanto o fotografo se intrometeu em seu mundo a parte do
mundo real. Vicente, seu avô, caminha de costa para fora do puxadinho. O “gigante
gentil”, uma referência a banda inglesa de rock progressivo dos anos 70 “gentle
giant”, apressa-se para que seu gigantismo não domine o cenário que o fotografo
escolheu para sua maquina fotográfica.
O
olhar de “rei” Artur sugere “fúria”: “Porquê tu me fotografas?” ou “Para de me
fotografar.” A realidade que a fotografia revelará o enfurece ou o enfastia? A técnica
revela que o brincante se contrapõe a realidade enfastiante só que a brincadeira
deve permanecer fechada em sua linguagem e em seus propósitos. A fotografia
flagra “rei” Artur no seu reino de inexistências. Um reino tão fácil de ser
anulado pelos vários reinos que o circundam. O reino de Artur tem seu
equivalente na dimensão do real no reino de seu avô Vicente de Paula que
precisa provar junto com a sua família a relevância de sua existência perante o
seu vizinho Andre Introvini, plantador de soja do Mato Grosso do Sul. O reino
do Andre Introvini começou a se estender por Buriti a partir da virada do
século. Partiu de 200 hectares ou quem sabe bem menos. Os agricultores maranhenses
mantinham suas posses de 100 a 200 hectares em Chapadas, heranças deixadas
pelos pais ou avós, na esperança de fazerem um “bom” negócio. O Andre Introvini
representava esse “bom” negócio assim como os demais plantadores de soja que chegaram
em Buriti e no restante do Baixo Parnaiba. As negociações em torno das Chapadas
duravam poucos dias ou, por diabos, poucas horas. A necessidade dos posseiros
ditava o ritmo das negociações e os valores a serem pagos.
A propriedade de
Vicente de Paula de 160 hectares na Chapada do povoado Carrancas desafia o reino
da soja dos Introvini, pois mantem firme a decisão de não negociar. O “gigante gentil”
Vicente de Paula não herdou sua posse como outros agricultores que ao herdarem
a primeira providência foi vender a quem pudesse pagar. Vicente de Paula e sua família
passaram a viver sobre a Chapada a revelia da maioria das pessoas dos povoados
que viam um total desproposito nessa ideia. A primeira vista, o reino (a
propriedade) de Vicente e de seus familiares inexistia para quem passasse pela
Chapada. Inexistia porque só se via mato sem nenhuma utilidade (na avaliação
das outras pessoas é claro) e porque era um lugar impraticavel para morar.
As famílias poderosas de Buriti premiaram Vicente
e seus familiares com a inexistência social. Quer dizer, nada que você faça
fará a menor diferença e não terá o menor efeito sobre a realidade nua e crua porque nosso projeto político-social não inclui e nem incluirá sua
familia, seus projetos e seus sonhos. A realidade e a história provaram o contrário. O seu Onésio, morador do povoado Carrancas, ajudou a iluminar a história
do “gigante gentil” em 2010. O Fórum Carajás propôs que um projeto de
biodiversidade fosse destinado ao povoado e o seu Onésio sugeriu a propriedade
(reino) de Vicente como espaço de demonstração. O Fundo Casa apoiou vários projetos
em Buriti na propriedade (reino) do Vicente e em outras pequenas propriedades (reinos)
de Buriti entre 2010 e 2020. O “reino” da soja continua avançando em direção a “reinos” menores
de Buriti com a subserviência das elites locais e a conivência de setores da
sociedade buritiense sem que haja nenhuma legislação que o impeça ou limite. O atual
prefeito vetou o artigo no projeto de lei da vereadora Vanusa Flora que
limitava o desmatamento em Buriti. A experiência dos projetos desenvolvidos
pelo Fórum Carajás indica que a inexistência a qual as elites relegaram sua
população está com os dias contados.
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