segunda-feira, 18 de outubro de 2021
O senhor negro
De uma hora para outra, ele passou a descer sozinho a rua. Ocasionalmente, um amigo o acompanhava. Nem sempre o amigo estava desocupado e nessas ocasiões ele hesitava em descer. Não entrava em lugar nenhum sem antes pedir licença e fazer amigos era uma forma de pedir licença ao entrar em determinados lugares. Objetivava ao descer a rua um pequeno bar/restaurante que vendia mocotó aos dias de domingo pela manhã. O bar de dona Elisabeth, maranhense, nascida no município da Matinha, baixada ocidental, carregava suas sutilezas e excepcionalidade, o que atraia mais consumidores do que as demais mulheres que também cozinhavam mocotó na rua para garantir um trocado. A principal delas era o fato de que a pessoa ao comer o mocotó podia também tomar uma cerveja ou várias cervejas, dependendo do mocotó e do papo. Ele sempre andava atrás de um bom papo para aplacar a rotina ou o calor do dia. As circunstancias em que conheceu o bar de dona Elisabeth foram bem típicas disso: sozinho em casa. sem fazer nada, convidou o amigo para caminharem pelas ruas próximas e quem sabe comer alguma coisa. A fisionomia do bar era bem simples e pouco destoava da vizinhança. Quem frequenta são os moradores ou ex-moradores que veem no bar um espaço para reviver as amizades. O amigo o apresentara ao bar no momento em que moradores e ex-moradores reinavam no ambiente. Todo o tempo alguém entrava para comprar mocotó, cerveja ou cachaça. Ele provou e aprovou o mocotó. Quis repetir mais vezes. Sem sucesso. Ou o mocot[o terminara cedo ou a dona Elisabeth não cozinhara como no dia em que faltara água no bairro todo. Não se deu por vencido. Arriscou num domingo. Por sorte, a cozinha se atrasara um pouco. Esperou mais de vinte minutos enquanto a cozinheira concluía o serviço. Nesse interim, adentrou um senhor negro que se sentou a sua frente. Calado sentou, calado ficou. Poderia ter ficado mais tempo para ver se o senhor negro lhe concedia uma palavra. Saber como era a voz dele. Ficaria pra próxima.
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