sexta-feira, 25 de junho de 2021
Nomes aos bois
Fazendas de gado, pouca vegetação, capim adoidado, igarapés aterrados por ordem de proprietários e proibição de pesca aos moradores das vizinhanças. Primeiras impressões no caminho para Cuba, comunidade quilombola do município de Santa Inês. Sim, pensou muito que poderia ser uma viagem a Havana, capital de Cuba, sobrevoando o oceano. Essa viagem ficaria para sabe Deus quando. Naquele dia, pensava em Cuba e o que ficaria sabendo dela e das outras comunidades (Marfim e Onça) que formam o único território quilombola de Santa Inês. O que resta de floresta amazônica se encontra na comunidade Cuba com o sugestivo nome de Cedro. Os testemunhos dos moradores indicam que os quilombolas chegaram aquela parte do Maranhão no começo do século XX. Eles abriram caminho pela mata. Nesse local, distante de tudo e de todos, fincaram moradia por existir muita água, muita terra, muita caça e muita madeira. Eram só eles nesse recanto. Um dos moradores mais velhos relembrou a sua infância e adolescência “Minha mãe morreu cedo e nosso pai nos criou sozinho. Com o tempo, ele ia para roça na nossa companhia”. De vez em quando, aparecia um novato que pedia a um dos fundadores da comunidade licença para roçar em um determinado ponto da terra. O novato roçava e cansado da lida diária vendia aquele pedaço para os fazendeiros da região que aos poucos abocanhavam mais e mais pedaços aumentando suas fazendas. Atualmente, sobrou para a comunidade de Cuba 200 hectares e nesse tanto de hectares se visualiza a reserva do Cedro que pelo nome sugere a presença da madeira Cedro, madeira de lei cara. Uma rede de grilagem de terras formada por corretores de imóveis e fazendeiros vem se esforçando para capturar e desmatar essa reserva. Os nomes que se destacam nessa rede: Egberto, o grileiro, Henrique Salgado, ex-prefeito de Pindaré, e Felipe Bringel, empresário de Santa Inês. O nome Egberto aparece em primeiro porque ele é o que chega de mansinho, tratando o quilombolas como amigos e irmãos. Quem não quer se agradado? Os quilombolas passaram décadas apartados da vida social e econômica de Santa Inês e esse apartheid social gerou necessidades de contatos fora da comunidade. O Egberto viu nisso oportunidades de negócio, ou seja, venda de terras dos quilombolas de Cuba para empresários. Um desses empresários foi o senhor Henrique Salgado, ex prefeito de Pindaré, que ao descobrir de que área se tratava repassou para o senhor Felipe Bringel, empresário do ramo médico e pecuarista. Funcionários do senhor Bringel se dirigiram a comunidade com motosserras com a intenção de cortar madeira da reserva do Cedro. Cortou-se algumas árvores. O senhor João, morador antigo, impediu que os cortes continuassem. No dia seguinte, um trator se deslocou a mando do senhor Bringel para o desmate que náo ocorreu porque o senhor João botou um cadeado na cancela que fecha e abre a entrada da reserva. O tratorista perguntou quem fechara a cancela o que seu João respondeu “fora ele” e ao ouvir isso o tratorista avisou que retornaria no dia seguinte e passaria por cima de quem quer que fosse. “Pois venha”, disse seu João. A comunidade e organizações da sociedade civil expuseram as ameaças a nível nacional. O senhor Bringel, por conta da repercussão, pediu desculpas aos quilombolas e afirmou que devolveria o terreno ao Egberto. A câmara de vereadores de Santa Inês, nesse caso, tomou partido do Egberto. O Adaozinho, vereador e corretor de imóveis, fez um pronunciamento em favor de Egberto “de que tudo é legal” e uma comissão de vereadores numa visita a comunidade defendeu os interesses do grileiro e do fazendeiro. Entre os vereadores, estava o presidente da câmara que falou para “os quilombolas deixarem pra lá aquela reserva”. Os quilombolas abriram mão do seu território várias vezes e não desejam faze-lo mais.
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