Discriminam-na
como Chapada Limpa porque, em parte do seu relevo, não há vegetação, só um
campo liso. Antes que o presidente Luis Inácio Lula da Silva assinasse o
decreto de criação da reserva extrativista Chapada Limpa, no ano de 2007, o
nome Chapada remetia, para aqueles que supunham a sua existência, qualquer que
seja a Chapada, a regiões planas, a grandes extensões físicas, a difícil acesso
e a nenhuma infraestrutura. A hipótese de conservação de um espaço físico-ambiental,
no Cerrado leste maranhense, para que as comunidades o usufruíssem, tornou-se premente
com o avanço dos plantios de soja, principalmente, nos municípios de Mata Roma,
Anapurus, Brejo e Buriti de Inácia Vaz. A categoria reserva extrativista,
dentro do universo das unidades de conservação, permite que as populações
tradicionais possam continuar vivendo dentro do espaço da unidade de
conservação. A baixa incidência dessa categoria sobre o Cerrado reflete um
pensamento que rotula o bioma como mero espaço econômico para a expansão das
monoculturas. O decreto da Chapada Limpa abarca quase doze mil hectares, entre
Chapadas e Baixões, no município de Chapadinha, consagrando-a às populações
tradicionais que coletam o bacuri, o babaçu, a juçara e o buriti, e veio, exatamente, quando empresários
designavam partes da Chapada como suas e requeriam reintegrações de posse
contra comunidades seculares.
O
projeto “Chapada Limpa”, do Centro dos Direitos das Populações da Região de
Carajás, recebeu aportes do Centro de Apoio Socioambiental (CASA), no ano de
2008, dentro do Fundo Soja, com vistas a consolidação da Chapada Limpa como
alternativa plausível às monoculturas no Baixo Parnaiba maranhense. O decreto
assegurava a posse das comunidades, mas a consolidação da reserva evoluiria
pela apreensão da importância da Chapada Limpa por parte do município de
Chapadinha e de setores socioeconômicos cujas propriedades o governo federal
desapropriou. O relatório do Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente) que
subsidiou a criação da reserva ressalta o bacuri, espécie de origem amazônica,
como uma das grandes molas que propulsionam o extrativismo de caráter familiar
na região. Os extrativistas vendem as centenas de frutos ou os quilos da polpa
de bacuri para compradores da própria região e compradores do Pará e do Piaui. Durante
a safra de bacuri, as comunidades visam qualquer bacurizal da Chapada a fim de
dar conta da demanda da fruta.
Desconheciam-se
as dinâmicas da agricultura familiar e do extrativismo como a coleta do bacuri.
Caracterizava-se a coleta como atividade de subsistência cujos efeitos econômicos
paravam no comércio da comunidade e nada mais. Quer dizer, não havia retorno econômico.
No máximo, as pessoas toleravam essas demonstrações de extrativismo. O projeto “Chapada
Limpa” se dispunha a questionar essa “tolerância” que interessava aos empresários
do ramo da soja. Com o projeto, estabeleceu-se que havia uma cadeia produtiva
do bacuri e que essa cadeia congregava vários atores econômicos de pequeno e
médio porte da região e de outros estados. Estabeleceu-se também que o bacuri é
uma espécie de interesse social, econômico e ambiental para as comunidades e
para a região. Estabeleceu-se que as comunidades tem o direito de botar o preço
na centena ou no quilo da polpa do bacuri. Estabeleceu-se a necessidade da
criação de outras Resex na região. De alguma forma ou de outra, essas informações
constavam do repertório das comunidades pelos contatos que mantiveram com o
Ibama durante o processo de discussão da Resex. Entretanto, elas convergiram durante
o seminário “Bacuri: Do alto das Chapadas ao comércio nas cidades”, onde se
encontraram Fórum Carajás, Sindicato de Trabalhadores Rurais de Chapadinha, pesquisadores
da Universidade Federal do Maranhão, Sebrae, Banco do Nordeste e agricultores.
A execução do projeto
“Chapada Limpa” levou um ano. Pensou-se nele como uma forma de ampliar os benefícios
da criação da reserva extrativista da Chapada Limpa para além dos seus limites
geográficos, através de publicação de jornais e de participação em oficinas e
em seminários. A reserva “Chapada Limpa” se reveste de um simbolismo histórico
por ter sido a última unidade de conservação federal criada no Cerrado
brasileiro. Para as comunidades do seu interior, a reserva não é só isso. O
aumento na produção do Bacuri e a absorção de técnicas de beneficiamento da
polpa que valorizam cada vez mais o fruto indicam o quanto as comunidades
avançaram em cinco anos. Mayron Régis
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