sábado, 2 de março de 2013

O sumiço dos processos do Getat


Por  Montezuma Cruz*
rabalhei durante quase dez anos em Rondônia, na Amazônia Ocidental Brasileira. Até então acreditava que lá se concentravam os maiores entraves fundiários do País. Equivocara-me: conheceria um pouco do imbróglio protagonizado por pessoas que pretendiam criar o Maranhão do Sul.

Em São Luís (MA) recebi do Jornal do Brasil algumas missões no sul do estado, próximo à divisa com o Pará. Publiquei diversas reportagens revelando o desmonte do Grupo Executivo das Terras do Araguaia e Tocantins (Getat), instrumento do regime militar que privilegiou altos funcionários civis, militares, o filho de um ex-ministro e um ex-governador de Goiás. Alguns viraram fazendeiros sem investir um centavo em Goiás, no Pará e no Maranhão.

Não faltava dinheiro para dividir o estado. A União Democrática Ruralista (UDR) cotizava-se pela emancipação, cujo movimento fora liderado pelo senador Edson Lobão (PFL-MA). Seus aliados eram Davi Alves da Silva (PDS), autor da proposta e José Teixeira (PFL), apoiados pela bancada pefelista na Assembleia Legislativa, liderada pelos deputados Leo Franklin e Raimundo Cabeludo.

Em meio à enorme bagunça o Getat não tinha metodologia correta para formular processos de desapropriação. Com isso, 24 deles desapareceram entre 1980 e 1987, quando a UDR agia com todas as suas garras no Maranhão, conseguindo prejudicar o trabalho de poucos servidores eficientes do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e do próprio Ministério das Reforma e Desenvolvimento Agrário, conhecido pela sigla Mirad.

O deputado federal Davi Silva, dono da Fazenda Data Taboleirão no município de João Lisboa, fazia parte do grupo beneficiado e ainda era acusado pelo jornal da família Sarney de ser “aliado ao crime organizado”.

Os separatistas alinhavam seus pontos fortes: Imperatriz, futura capital, tinha na época um milhão de cabeças de gado, forte indústria madeireira, 300 mil toneladas de arroz por ano, 60 mil t de milho, 12 mil t de soja e seria um polo produtor de ferro gusa (nove usinas já funcionavam em Açailândia), fortalecendo-se ainda com a Ferrovia Norte-Sul.  Segundo seus líderes, Maranhão do Sul poderia nascer com 108 mil km² e 850 mil habitantes.

Já o ex-governador Luiz Rocha, um dos mandatários da UDR, protegera muita gente por meio do Instituto de Terras do Maranhão (Iterma). A extinta Companhia de Terras do Maranhão (Coterma) que funcionara no governo João Castelo, compadre de José Sarney, também tinha culpa no cartório, pois amparara negociatas.

Não era só isso. O superintendente regional do Incra, Francisco de Assis Souza, e seu irmão, o vice-governador João Alberto de Souza (na época, ambos membros do Partido da Frente Liberal) entravavam o quanto podiam o andamento da reforma agrária nas 12 áreas de conflito com 300 mil hectares que deveriam assumir. Os fazendeiros eram amigos deles e exerciam influência na autarquia.

Os grileiros comemoravam. Entre os imóveis em litígio estavam os da Fazenda Pindaré: 84,5 mil hectares nos municípios de Açailândia e Santa Luzia, da União Agropastoril e Colonizadora Imperatriz; da Gleba Frades Industrial e Agropastoril (55 mil ha), de Bento Scalosi e Sebastião G. Neto, em Imperatriz, entre outros acima de 50 mil ha – latifúndios bafejados pelos incentivos fiscais da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e conhecidos com todas as letras nos escalões do poder em São Luís e em Brasília.


*Montezuma Cruz é editor de Amazônias. Colabora com Gente de Opinião, CaféHistória, Revista Momento, Supersitegood e Revista Sina (ambos de Cuiabá).

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