Sempre pensara
nesses projetos como uma forma de amparar as comunidades do interior do Maranhão
em suas desilusões e em suas deserções históricas. Como sacara isso? Arriscava-se
com um pensamento desses. Nada nesse estado florescia por livre e espontânea
vontade e quando florescia alguma força maior extirpava. Arriscar-se-ia, então,
como Walter Benjamin e Coleridge se arriscaram nas “profundezas da poética do
empréstimo” (George Steiner)?
Arriscar-se a troco de quê? As profundezas do Cerrado maranhense
surpreendem. “Que caminho é esse?” – Perguntara o funcionário da Suzano. “O
caminho que o gado segue para beber.” – respondera o senhor Rui, proprietário
da fazenda Bonfim. A Suzano Papel e Celulose e o senhor Rui encerraram ali a
compra da fazenda Bonfim. O encarregado da Suzano ficaria surpreendido caso
percorresse “o caminho do gado beber”. Aquele caminho levava à comunidade de
Bracinho, município de Anapurus, Baixo Parnaiba maranhense. Esse encarregado da
Suzano, em Urbano Santos, jamais regressou àquela parte da Chapada. Não
constava em seus planos um possível retorno. Ele desapontou alguém por isso? A
sua presença confortaria alguém? É bom ter em mente que, aos olhos de muitos,
as comunidades nada representavam ou nada diziam à sede do município. Elas se
desintegrariam e ficaria por isso mesmo. Quanto mais desintegrado o interior,
melhor para os proprietários e para as empresas que dividiriam a Chapada em
pequenas, médias e grandes extensões. As empresas de reflorestamento com
eucalipto e os plantadores de soja enxergavam a Chapada como um espaço vazio. O
Rui respondera ao encarregado da Suzano sem que este fizesse mais perguntas
sobre aquele ambiente. A pergunta que o encarregado fizera nada tinha de
excepcional e a resposta do Rui tampouco. O Rui retribuíra o desleixo do
encarregado com o seu próprio desleixo. O encarregado, no seu intimo,
contrariar-se-ia muito caso o levassem para conhecer “o caminho do gado beber”.
Nesse mundo do senhor Rui, o gado ocupava um lugar de destaque em detrimento da
comunidade de Bracinho. Ele se lembrava dos moradores de Bracinho na hora de
cobrar o pagamento por plantarem naquela Chapada. As pessoas acreditavam que o
Rui detinha os documentos daquela Chapada. Ele nunca mostrou esses documentos aos
moradores. As pessoas satisfaziam os seus interesses e não o contrário. Se
alguém dava trabalho, ele expulsava de Bonfim. Assim o fizera com um morador
que pretendia criar uma associação. Organizar os moradores em determinados
lugares passou a ser um assunto delicado. Os proprietários influenciavam a
maioria da comunidade a rejeitar a criação de uma associação e quando não
proibiam partia deles a proposta. Formou-se a Associação dos Moradores do Povoado
de Bracinho a partir da necessidade de lutar pela posse da terra. Eles se
consentiram essa formalização. Com a associação, os conflitos pela posse da
Chapada se acentuaram. Em todas as vezes, a Suzano se comportara como uma
empresa irretocável. A Secretaria de Meio Ambiente assinara as licenças, então
a empresa podia fazer o que bem quisesse. Os moradores de Bracinho, apenas com
a força das palavras e da organização, obrigaram a Suzano a recolher seus
tratores e mudar seus planos.
Mayron Régis
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