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Comunidade quilombola de Jacareí dos Pretos, municipio de Icatu
Quem frequenta, em grande
maioria, as reuniões em Jacareí dos Pretos, comunidade quilombola do município
de Icatu,são as mulheres. Mulheres jovens e idosas. Donas de casa e
trabalhadoras rurais. A dona Lucimar da Conceição Costa participou de várias
capacitações sobre meio ambiente. Para ela, a palestra é muito importante para
todos os moradores que tenham consciência, pois com a palestra se sabe onde
roçar e como queimar os roçados, e não roçar as margens dos rios, caso façam
roça os rios vão secar. A dona Heloisa comentou de uma vez em que visitando a
beira do rio se surpreendeu com um imenso desmatamento e as juçareiras
queimadas. Os seus parentes fizeram o serviço. A área desmatada era de sua avó.
A juçara se apresenta como uma das principais fontes de vitaminas para as
comunidades tradicionais e Jacareí dos Pretos não é diferente. As juçareiras
cobrem todas as margens do rio. Pediu-se que as pessoas escrevessem as espécies
frutíferas que podem ser encontradas em Jacareí. Simplesmente, as pessoas se
esqueceram de incluir juçara. Antes e durante a oficina de capacitação em meio
ambiente, os moradores de Jacareí ressaltavam o quanto as juçareiras tem
diminuído. Soa inacreditável que uma espécie tão importante para a alimentação
humana e para a conservação dos recursos hídricos como a juçara perca espaço no
cotidiano e na memória das pessoas. Sobre isso, uma das moradoras comentou que
aqueles que destroem a Juçara destroem a si mesmos e também destroem os demais.
A dona Irene tratou desse assunto quando disse que várias pessoas de Jacareí
compram juçara de lugares próximos em vez de comprarem na própria comunidade.
No dia anterior, a dona Irene amassou sementes de juçara para tirar uns dois
litros. Os seus sobrinhos menores repetiram inúmeras vezes depois que começaram
a beber. Ela não jogou fora ou em qualquer lugar as sementes de juçara. Próximo
a sua casa existe uma área que enche de água em tempo de chuva e nesse lugar
ela distribuiu a semente. Os moradores de Jacareí são bem informados com
relação a vários assuntos, entre os quais meio ambiente e produção. Eles
acolhem as informações, mas acolhem tão bem que essas informações ficam
guardadas no seu intimo. As mulheres participaram de capacitações de todo o
tipo. O problema é que elas e eles não põem em prática. Os moradores desmatam
para roçar uma área ou para tirar madeira e ninguém se preocupa em reflorestar
a área. Houve uma época em que gente de tudo quanto é lado entrava em Jacareí
para cortar madeira e sem pedir permissão para a comunidade. Essa terra não tem
dono, é de todo mundo, alguns repetem. A partir do momento em que o Incra e o
Aconeruq começaram a repassar informações sobre a questão ambiental e a questão
fundiária, essa realidade mudou. Com conflitos, é claro. Um morador cortou
algumas árvores e quando estava pronto para busca-las comunicou o seu Janjão,
presidente da associação. O seu Janjão comunicou que a madeira seria utilizada
na construção de uma estrutura para receber uma criação de galinha caipira e
uma horta. Ele viu a experiência num assentamento do município de Barreirinhas
e se animara. O morador que derrubou as arvores argumentou, mas não houve jeito.
Na reunião da associação, no segundo domingo do mês, outro morador pediu varas
e mourões para fazer um curral a fim de pescar. A direção questionou o fato de
que só desse jeito para ele aparecer em uma reunião e que ele e os outros
moradores de São Raimundo, povoado localizado no território de Jacarei, não
movem um dedo para impedir o desmatamento ilegal em algumas áreas do território
quilombola. Alguns moradores ainda acham que podem roçar e queimar as
cabeceiras das fontes de água. Os moradores se mostram indignados pela situação
de uma das principais fontes. As mães se cansaram de dizer aos filhos para não
irem para o meio da fonte. Qual foi a mãe que não fez isso em algum momento da
sua vida? As crianças e os jovens perderam o medo da água. Os menores se mandam
sozinhos para as fontes.Com os desmatamentos das margens e das áreas de
captação, o nível das fontes diminuiu. Além disso, as pessoas usam a água para
todos os fins, principalmente, lavar roupa e nessa utilização largam roupas
velhas e recipientes de plásticos. O lixo vai se acumulando. As mulheres de
Jacareí, depois de uma palestra do SENAR, formaram grupos de meio ambiente para
recolher o material que as pessoas deixam próximo e dentro das fontes de água. A
dona Natalina saiu de sua casa para falar um pouco da situação da principal
fonte de Jacareí. Ela tinha acabado de chegar de lá onde lavara sua roupa. Para
o uso doméstico ela se vale da água do poço construído por sua irmã. A
lembrança da água de boa qualidade ressurge. Era uma água azul. Os moradores de
Jacareí não se defrontam com falta de água como acontece com outras comunidades
e com outros municípios do Maranhão e do Brasil. Entretanto, os invernos entre
2012 e 2013 foram fracos. A diminuição do regime das chuvas acarreta a
diminuição do volume da água nas fontes. Explicou-se que a mudança de clima que
eles sentem na falta de chuvas decorre do modelo de produção que a humanidade
implanta desde os primeiros anos de sua existência e que mais, recentemente,
intensifica-se com o maior consumo de carne e de combustíveis fosseis. O
consumo de carne de gado e de combustives fosseis fazem com que as pessoas se
vejam de e vejam os outros de forma diferente. Algum dia, o ser humano já foi
coletor de frutas. Deixou de ser coletor para se tornar lavrador e carnívoro e
assim começou a desmatar e a urbanizar o planeta. A juçara é a principal fruta
da comunidade de Jacareí dos pretos. Existem muitas outras como o murici, a bacaba,
a mangaba, o bacuri. A Marcia, sobrinha de dona Irene e de seu Janjão vende a
polpa de murici. Ela notou as frutas se estragavam no chão e isso a motivou a
querer aproveitar o murici. Um dia antes da oficina de capacitação, ela enviou
vários quilos de polpa para seus parentes em São Luis. O que falta mesmo é um
freezer para guardar a polpa. Ela mora
na comunidade desde os primeiros anos. A mãe de dona Irene e de seu Janjão
pediu a mãe de sangue que a criasse. Perguntaram a Marcia o significado de ser
quilombola. Ela respondeu que não era quilombola. Como não, estranharam os
demais. A comunidade de Bom Sucesso onde Marcia nasceu é comunidade quilombola.
A resposta de Marcia mostra a distancia que existe entre os jovens e os
conhecimentos tradicionais.
Mayron Régis
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