Certa vez em um dia de sábado,
acordei cedo lembrando de quando era criança morando no Povoado Pequi. As
lembranças fizeram-me recordar das caçadas de passarinhos com baladeiras e da
procura de bacuris nas redondezas da chapada do humilde Povoado Riacho Seco,
uma comunidade próxima do Pequi, todos povoados de Urbano Santos, mas aquelas
caçadas todo mundo sabe que é tradicional para qualquer menino camponês e não
tem nada haver com as caçadas predatórias de hoje em dia. Foi com esse sentido
então que bateu uma velha saudade de visitar aquela chapada que há muito tempo eu
não a olhava.
Pedi minha mãe para colocar um frito
em minha bolsa e dirigi-me até a chapada do Riacho Seco, seguindo pela estrada
do Povoado Prata e Cocalinho do Sr. Louro, quando cheguei ao local percebi que
estava tudo diferente, pois mais de vinte anos se passaram, quase nem sabia
mais as veredas que dava acesso as roças de janeiro e San Nunga do Tio João.
Deixei a moto escondida dentro do mato e trilhei a vereda saindo da chapada em
direção à mata de coco babaçu para encontrar o riacho chamado de “grota da
bicuíba.” Cansei de caminhar, pois a distancia é bastante longe, parei para
merendar debaixo de um pé de murici e por um momento senti a calmaria da
natureza somente com o canto dos pássaros. Após a merenda, prossegui abrindo o
mato da vereda fechada. Quando desci a
ladeira da grota, um juriti tomou arranco fazendo um barulho esquisito, até me
espantei. Segui contra as águas da grota pulando de pedra em pedra, olhei
muitas coisas diferente principalmente a flora, muitos pés de najá e tucum,
frutinhas do mato como maria preta e mão melada, além de murtas. Passei muitas
horas andando pela selva, tudo mudou daquela época para cá quando eu era
criança e por ali passeava com baladeiras e cabaças. Quando deu as horas depois
do meio dia, levantou-se um temporal de chuva, a mata fechada começou a
escurecer, trovoadas e relâmpagos atormentavam meu pensamento, pois estava
sozinho e Deus. Mas não choveu nada, apenas alguns pingos, o vento levou tudo.
Mas voltei pela mesma vereda em direção a chapada novamente, quando cheguei nos
primeiros capinzais e pés de candeias, o tempo clareou, aproveitei então para colher algumas pitombas de leite e
murici vermelhos da chapada. Vi uma coisa diferente também na chapada, por
exemplo, quando os trabalhadores rurais há vinte anos atrás faziam roças ali
naqueles locais, quase sempre a chapada estava em chamas, podemos dizer que as
vezes os próprios trabalhadores devem tomar consciência de preservar seus
locais. Mas a versão é que era dos trabalhadores, onde na verdade não era eles
quem botavam fogo na chapada, quem praticava esse crime eram caçadores vindos de
Urbano Santos, Mata Roma e até Chapadinha, atraídos pela fartura de animais
silvestres como tatus, pebas, mambiras, veados, caititus, jacus, nambus e
muitos outros. Deixa que esse problema agravou-se porque estes caçadores
ilegais não matavam apenas as caças, mas também os animais dos camponeses que
por ali pastavam como bodes e porcos. Percebi muito pasto e não vi nenhum mais
desses animais, o que aconteceu? O êxodo rural foi o responsável por tudo isso.
Os moradores de Riacho Seco e Pequi, quase todos foram morar na sede de Urbano
Santos, deixando então seu lugar esquecido. Não se ver mais roças naquela
localidade, apenas alguns jumentos e cavalos, nem gado que era comum, se ver
mais.
Mas algo de interessante ficou nessa
história: a natureza preservada, até então. Pois os gaúchos ainda não souberam
das maravilhas daquela chapada do Riacho Seco. As terras são de proprietários
que ainda não venderam. Espera-se que não vendam nunca, nem para gaúchos, muito
menos para a Suzano Papel e Celulose. Conclui portanto “a experiência de trilhar uma vereda na chapada do povoado Riacho Seco”-
voltei pela a antiga sede do povoado onde quase não mora mais ninguém, lá resta
apenas a casa do Senhor Mundinho. Parei por lá para beber um pouco de água e
conversar com aquele velhinho sábio. Voltei para casa, chegando mais ou menos
as quatro horas da tarde, com a consciência de dever cumprido.
(JOSÉ ANTONIO BASTOS)
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