As
comunidades quilombolas do Maranhão, diante da falta de um mínimo
respeito aos seus direitos assegurados por lei, pelas instituições INCRA
e ITERMA e dos próprios Governos Federal e Estadual, decidiram lançar
um manifesto público para que seja de domínio público, o tratamento que
vem sendo dado aos afrodescendentes do Maranhão. Muitas comunidades
estão sofrendo a opressão da violência armada comandadas por políticos,
grileiros e empresários do agronegócio. Como a problemática assume
proporções graves, os povos afrodescendentes decidiram lançar o seguinte
manifesto, ante a violência armada e covarde praticada contra homens,
mulheres, crianças e idosos.
Passados 25 anos da promulgação
da Constituição da República Federativa do Brasil nós, Comunidades
Quilombolas e Povos Indígenas do Brasil, estamos nas ruas para
denunciar os ataques aos nossos Direitos Fundamentais inscritos na nossa
Carta Magna.
Resultados de nossas lutas históricas foram inscritos na Constituição:
Art. 231. São reconhecidos aos
índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e
os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam,
competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus
bens.
Art. 68. Aos remanescentes das
comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida
a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos
respectivos (ADCT).
Entretanto, ao longo dos anos
assistimos ao descumprimento desses mandatos constitucionais o que tem
gerado mais conflitos e ameaças à nossa existência física e cultural.
Até o presente foram Certificadas pela Fundação Cultural Palmares 1.845
comunidades quilombolas. Estão abertos 1.264 processos de titulação
territórios quilombolas (alguns na fase inicial) e foram titulados
apenas 124 territórios, desses apenas 39 expedidos exclusivamente pelo
governo federal, através do INCRA e FCP, somando 995.009,0875 hectares.
Nossas comunidades quilombolas
perseguidas e ameaçadas por latifundiários, pecuaristas, empresas
mineradoras, de monoculturas de soja, eucalipto e cana-de-açúcar estão
cada vez ameaçadas de expulsão de nossos territórios com ou sem mandato
judicial. Essa pressão aumenta à medida que os governos federal e
estadual se curvam e sucumbem aos interesses do capital defendidos no
Congresso Nacional pela bancada ruralista. Assim os ataques aos nossos
direitos vem dos três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário.
No Poder Judiciário tramita uma
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) patrocinada pelo Partido
Democratas (DEM) contra o decreto presidencial Nº 4.887/2003 que:
“regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento,
delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por
remanescentes das comunidades dos quilombo os de que trata o art. 68 do
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias”.
Na 8ª Vara da Justiça Federal,
no Maranhão, tramitam várias ações possessória visando manter as
comunidades quilombolas em suas posses, entretanto, preocupa-nos a
postura do magistrado de devolver essas ações à Justiça Estadual, como
ocorreu recentemente com ação de reintegração de posse contra a
comunidade quilombola de Açude, Serrano do Maranhão, e Aldeia Velha,
Pirapemas.
No Congresso Nacional, dominado
pelos ruralistas, tramitam vários projetos de lei, além da Proposta de
Emenda Constitucional Nº 215/2000, que, se aprovada, retirará a
competência do poder executivo nos processos de titulação dos
territórios quilombolas e das terras indígenas. Vale lembrar que o no
último dia 10de setembro o Presidente da Câmara, Henrique Alves
(PMDB-RN) criou a Comissão para apresentar o Relatório ao Plenário para
votação da PEC.
O Tribunal de Contas da União –
órgão auxiliar do poder legislativo – em Acórdão Nº 2835/2009 fez uma
série de recomendações absurdas relativas ao processo de titulação dos
territórios quilombolas. Entretanto, o mesmo Tribunal em julgamento de
embargos opostos ao Ácordão supracitado assim se pronunciou: “convém
deixar assente que o objeto da demanda judicial entre a comunidade dos
remanescentes do quilombo da Ilha da Marambaia e a União constitui
matéria de competência exclusiva do Poder Judiciário, não cabendo ao TCU
posicionar-se quanto ao mérito da decisão proferida no âmbito daquele
Poder”.
Mesmo assim o INCRA está
adotando as recomendações do TCU, como ocorreu em manifestação da
Autarquia em Ação de Reintegração de Posse contra a Comunidade
Quilombola de Cruzeiro, Palmeirândia, que tramita na Justiça Federal –
Seção Judiciaria do Maranhão. Além disso, justificou a paralisação do
procedimento objeto da ação judicial em função de entendimento de que
tais recomendações teriam suspendido o decreto 4.887/2003.
Essa postura do INCRA demonstra o
nível de comprometimento do governo federal com os latifundiários,
pecuaristas e empresários dos setores do agronegócio, do hidro negócios,
das hidroelétricas, da mineração, etc.
ASSIM, DIRIGINDO-NOS,
Ao Poder Executivo:
- 1. Ratificamos a reivindicação dos servidores do INCRA para que este Órgão seja “estruturado e fortalecido com capacidade de atuar com efetividade na defesa dos direitos constitucionais dos quilombolas e na sua missão institucional de titular seus territórios”.
- 2. Repudiamos o estabelecimento por parte da Direção do INCRA de novas rotinas administrativas, excepcionais e extra normas, que estão protelando a efetivação da política pública e a concretização do nosso direito aos nossos territórios;
- 3. Exigimos a imediata revogação de exigências impostas pela Direção Nacional do INCRA: 1) de que sejam informadas as “áreas efetivamente ocupadas” por comunidades com processos de regularização tramitando no órgão; e 2) a prévia autorização da direção nacional para publicação do RTID’s;
- 4. Reivindicamos a imediata Publicação de Portaria de Reconhecimento do Território Quilombola do Charco, onde foi assassinado Flaviano Pinto Neto, em 2010, no município de São Vicente Ferrer – MA;
- 5. Que seja estabelecido Cronograma para a Conclusão e Publicação dos RTID’s em andamento na Superintendência do INCRA-MA.
- 6. Exigimos do Governo do Estado do Maranhão a regularização fundiária das comunidades remanescentes de quilombos;
Ao Poder Legislativo
- 7. Repudiamos a Proposta de Emenda Constitucional Nº 215/2000. E exigimos seu imediato arquivamento, pois caso seja aprovada, como quer a bancada ruralista, aumentarão os conflitos e a violência contra nós, povos indígenas e quilombolas.
Ao poder Judiciário:
- 8. Arquivamento, sem julgamento do mérito, da ADIN 3239/2004.
- 9. O Julgamento dos mandantes e executores do assassinato de Flaviano Pinto Neto, ocorrido em 30 de outubro de 2010, do quilombo Charco, município de São Vicente Ferrer – MA.
Por último, conclamamos os
homens e mulheres de boa-vontade das Religiões e Igrejas, da Sociedade
para lutarmos contra o extermínio do povo negro e dos indígenas no campo
e na cidade.
Pois, nossa esperança, nascida
na noite escura, será fogo incontido, que fará alvorecer o dia novo!
Nossos tambores serão escutados e nossos Ancestrais, desde África jamais
serão esquecidos!
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