segunda-feira, 30 de setembro de 2013

MANIFESTO DAS COMUNIDADES QUILOMBOS

                 As comunidades quilombolas do Maranhão, diante da falta de um mínimo respeito aos seus direitos assegurados por lei, pelas instituições INCRA e ITERMA e dos próprios Governos Federal e Estadual, decidiram lançar um manifesto público para que seja de domínio público, o tratamento que vem sendo dado aos afrodescendentes do Maranhão. Muitas comunidades estão sofrendo a opressão da violência armada comandadas por políticos, grileiros e empresários do agronegócio. Como a problemática assume proporções graves, os povos afrodescendentes decidiram lançar o seguinte manifesto, ante a violência armada e covarde praticada contra homens, mulheres, crianças e idosos.
Passados 25 anos da promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil nós, Comunidades  Quilombolas e Povos Indígenas do Brasil, estamos nas ruas para denunciar os ataques aos nossos Direitos Fundamentais inscritos na nossa Carta Magna.

Resultados de nossas lutas históricas foram inscritos na Constituição:
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
Art. 68. Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado  emitir-lhes os títulos respectivos (ADCT).
Entretanto, ao longo dos anos assistimos ao descumprimento desses mandatos constitucionais o que tem gerado mais conflitos e ameaças à nossa existência física e cultural. Até o presente foram Certificadas pela Fundação Cultural Palmares 1.845 comunidades quilombolas. Estão abertos 1.264 processos de titulação territórios quilombolas (alguns na fase inicial) e foram titulados apenas 124 territórios, desses apenas 39 expedidos exclusivamente pelo governo federal, através do INCRA e FCP, somando 995.009,0875 hectares.
Nossas comunidades quilombolas perseguidas e ameaçadas por latifundiários, pecuaristas, empresas mineradoras, de monoculturas de soja, eucalipto e cana-de-açúcar estão cada vez ameaçadas de expulsão de nossos territórios com ou sem mandato judicial. Essa pressão aumenta à medida que os governos federal e estadual se curvam e sucumbem aos interesses do capital defendidos no Congresso Nacional pela bancada ruralista. Assim os ataques aos nossos direitos vem dos três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário.
No Poder Judiciário tramita uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) patrocinada pelo Partido Democratas (DEM) contra o decreto presidencial Nº 4.887/2003  que: “regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombo os de que trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias”.
Na 8ª Vara da Justiça Federal, no Maranhão, tramitam  várias ações possessória visando manter as comunidades quilombolas em suas posses, entretanto, preocupa-nos a postura do magistrado de devolver essas ações à Justiça Estadual, como ocorreu recentemente com ação de reintegração de posse contra a comunidade quilombola de Açude, Serrano do Maranhão, e Aldeia Velha, Pirapemas.
No Congresso Nacional, dominado pelos ruralistas, tramitam vários projetos de lei, além da Proposta de Emenda Constitucional Nº 215/2000, que, se aprovada, retirará a competência do poder executivo nos processos de titulação dos territórios quilombolas e das terras indígenas. Vale lembrar que o no último dia 10de setembro o Presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN) criou a Comissão para apresentar o Relatório ao Plenário para votação da PEC.
O Tribunal de Contas da União – órgão auxiliar do poder legislativo – em Acórdão Nº 2835/2009 fez uma série de recomendações absurdas relativas ao processo de titulação dos territórios quilombolas. Entretanto, o mesmo Tribunal em julgamento de embargos opostos ao Ácordão supracitado assim se pronunciou: “convém deixar assente que o objeto da demanda judicial entre a comunidade dos remanescentes do quilombo da Ilha da Marambaia e a União constitui matéria de competência exclusiva do Poder Judiciário, não cabendo ao TCU posicionar-se quanto ao mérito da decisão proferida no âmbito daquele Poder”.
Mesmo assim o INCRA está adotando as recomendações do TCU, como  ocorreu em manifestação da Autarquia em Ação de Reintegração de Posse contra a Comunidade Quilombola de Cruzeiro, Palmeirândia, que tramita na Justiça Federal – Seção Judiciaria do Maranhão. Além disso, justificou a paralisação do procedimento objeto da ação judicial em função de entendimento de que tais recomendações teriam suspendido o decreto 4.887/2003.
Essa postura do INCRA demonstra o nível de comprometimento do governo federal com os latifundiários, pecuaristas e empresários dos setores do agronegócio, do hidro negócios, das hidroelétricas, da mineração, etc.
ASSIM, DIRIGINDO-NOS,
Ao Poder Executivo:
  1. 1.      Ratificamos a reivindicação dos servidores do INCRA para que este Órgão seja “estruturado e fortalecido com capacidade de atuar com efetividade na defesa dos direitos constitucionais dos quilombolas e na sua missão institucional de titular seus territórios”.
  2. 2.      Repudiamos o estabelecimento por parte da Direção do INCRA de novas rotinas administrativas, excepcionais e extra normas, que estão protelando a efetivação da política pública e a concretização do nosso direito aos nossos territórios;
  3. 3.      Exigimos a imediata revogação de exigências impostas pela Direção Nacional do INCRA: 1) de que sejam informadas as “áreas efetivamente ocupadas” por comunidades com processos de regularização tramitando no órgão; e 2) a prévia autorização da direção nacional para publicação do RTID’s;
  4. 4.      Reivindicamos a imediata Publicação de Portaria de Reconhecimento do Território Quilombola do Charco, onde foi assassinado Flaviano Pinto Neto, em 2010, no município de São Vicente Ferrer – MA;
  5. 5.      Que seja estabelecido Cronograma para a Conclusão e Publicação dos RTID’s em andamento na Superintendência do INCRA-MA.
  6. 6.      Exigimos do Governo do Estado do Maranhão a regularização fundiária das comunidades remanescentes de quilombos;
Ao Poder Legislativo
  1. 7.      Repudiamos a Proposta de Emenda Constitucional Nº 215/2000. E exigimos seu imediato arquivamento, pois caso seja aprovada, como quer a bancada ruralista, aumentarão os conflitos e a violência contra nós, povos indígenas e quilombolas.
Ao poder Judiciário:
  1. 8.      Arquivamento, sem julgamento do mérito, da ADIN 3239/2004.
  2. 9.      O Julgamento dos mandantes e executores do assassinato de Flaviano Pinto Neto, ocorrido em 30 de outubro de 2010, do quilombo Charco, município de São Vicente Ferrer – MA.
Por último, conclamamos os homens e mulheres de boa-vontade das Religiões e Igrejas, da Sociedade para lutarmos contra o extermínio do povo negro e dos indígenas no campo e na cidade.
Pois, nossa esperança, nascida na noite escura, será fogo incontido, que fará alvorecer o dia novo! Nossos tambores serão escutados e nossos Ancestrais, desde África jamais serão esquecidos!

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