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Jorge Vieira
“O seu Joca, por exemplo, tem o terreno
com mais de 160 metros e um dos filhos dele, o que mora numa casa de taipa,
começou a construir uma casa de alvenaria no outro do limite do terreno. Foi lá
que eles (os vigias da WPR) entraram, cortaram o arame e colocaram a área como
deles”, foi um das denúncias feitas ao deputado estadual Bira do Pindaré (PSB)
durante visita do socialista à comunidade do Cajueiro. Relatos e
questionamentos não param nesta denúncia e comunidade rebate todas as
justificativas e explicações da empresa.
Os moradores, que se organizaram em
manifestação no último dia 15 de outubro, voltaram a relatar truculências por
parte da WPR, empresa que pretende construir um porto privado em parte do
território da comunidade do Cajueiro. Moradores afirmam que a empresa assumiu
postura opressora não apenas contra os líderes do movimento, mas contra todos
os moradores que desejam ir até a praia, mangue ou sítio vizinho. De acordo com
relatos de uma antiga moradora, a WPR chegou a colocar um portão e placas com o
intuito de intimidar as pessoas.
“A gente mora aqui há mais de 30 anos,
possui documento comprovando propriedade de terra e eles colocam jagunços para
tentar tomar o que é nosso por direito e por lei. É revoltante! Eles querem
colocar em nossas cabeças que nós somos os invasores e eles os proprietários”,
protestou.
A comunidade afirmou também que não
entende como a WPR pode ser dona de terras que faz parte de assentamento e,
mais, como é que pretende construir um porto em local de criação da Reserva
Extrativista Tauá - Mirim.
“Essa terra é área de assentamento, um
assentamento do ITERMA. Então, nós não estamos entendendo como é que eles
compraram uma área de assentamento. A gente sabe que as pessoas podem até
vender a área de moradia, mas o local de trabalho, de plantio, a roça fica fora
da negociação, o que inviabilizaria esse mapa com área continua. Como é que
eles compraram e continuam comprando área de assentamento do ITERMA? Por que o
governo não vem explicar para nós como é que eles vão permitir a construção de
um porto em reserva extrativista”, questionou um dos moradores.
No último dia 16 de outubro a WPR
solicitou uma reunião com o deputado Bira do Pindaré como resposta ao
pronunciamento que o socialista fez no dia anterior sobre assunto. Na
oportunidade, apresentaram um mapa da área e alegaram que, além do terreno não
fazer parte da reserva extrativista, a WPR teve o cuidado de mandar equipe
antes, estudar as condições do terreno e pesquisar sobre a situação da
comunidade e contabilizaram apenas 31 famílias na área de interesse da empresa.
Segundo eles, o objetivo da empresa era
construir uma Vila com escolas e igreja, mas a proposta foi recusada pela
comunidade. Eles disseram que os moradores que venderam as propriedades
preferiram escolher uma casa em bairro mais urbano ou receber o dinheiro para
comprar a casa sem a intermediação da empresa.
Ainda conforme explicação dos
representantes da empresa, a WPR teve o cuidado de dar toda assistência
necessária para a comunidade, providenciando a mudança segura dos moradores
para as novas casas, a garantia de um terreno para plantio – mesmo afastado da
nova residência, além de outros auxílios, dependendo do caso.
Uma ex moradora confirma que a empresa
prometeu casa, trabalho e, inclusive, tratamento de saúde. No entanto, afirma
que após o pagamento e demolição da casa, a empresa não cumpriu os outros
pontos do acordo. “Eu tenho problemas de saúde, eles me prometeram tratamento,
mas depois que vendi a casa nunca mais retornaram meus contatos. Estou sem
dinheiro para comprar meus remédios e sem ter onde plantar. Comprei uma casa
que não vale o terreno da minha. Eu só vendi porque não tinha mais jeito”,
revelou.
Segundo o advogado Rafael Silva,
assessor jurídico da CPT, a Defensoria Pública do Estado trabalha no caso de
forma eficiente, questionando a tentativa de esbulho de posse e coação contra
os moradores tradicionais do Cajueiro. “Há um título de propriedade condominial
registrado no Cartório de Registro de Imóveis em nome de mais de uma centena de
famílias que foram regularizadas pelo ITERMA desde o final dos anos 1990 e
entregues pela governadora da época, Roseana Sarney (PMDB)”, informou ele.
Conforme os documentos, as casas
pertencem aos respectivos proprietários/moradores, mas os terrenos para cultivo
de plantas e criação de animais, geradores do sustento das famílias, pertencem
ao ITERMA e se trata de área de assentamento. A venda é proibida.
“Onde eles conseguiram formar esse mapa
para dizer que é uma área continua pode ter é um indicio de fraude, porque as
pessoas não vendem a roça, não vendem a terra de plantar a macaxeira, o
coentro, o alho. Os que venderam, venderam apenas a casa, que era o local de
moradia”, apontou um morador com quase 30 anos de residência no Cajueiro.
O morador frisou também que as pessoas
que venderam as casas foram pressionadas e que todas as famílias que fecharam
negócio com a empresa receberam o mesmo valor, independente do tamanho do
imóvel e melhorias na propriedade.
O território ocupado pela comunidade do
Cajueiro tem pouco mais de 600 hectares. Hoje, haverá uma Audiência Pública na
Câmara de Vereadores, solicitada pela vereadora Rose Sales (PCdoB), para tratar
do assunto.
“A empresa tentou isolar a comunidade,
enfraqueceu o papel da associação de moradores, tentou estimular a cobiça,
forjando um quadro de que as famílias estariam diante de um fato consumado. Mas
a realidade hoje é outra. As famílias tradicionais do Cajueiro se reergueram.
Apropriaram-se dos direitos que lhe estavam sendo silenciados e hoje pisam a
terra em que vivem sabendo que ali está sua identidade. É uma luta de Davi
contra Golias. E agora eles não estão mais só”, concluiu o assessor jurídico da
CPT.
*O nome das moradoras e moradores não foram citados por segurança. O mesmo cuidado foi tomado em relação aos representantes da empresa WPR.
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