Ele pensou na
“bendita” viagem que o levaria ao Baixo Parnaiba. Deduzia-se uma ironia e um
cansaço nesse “bendita”. O cansaço se apossara de seu corpo e de sua mente e
não queria larga-lo tão cedo. Ele enfrentava o cansaço com a ironia. A ironia o
desperta do torpor da realidade. Para ele, a palavra bendita vem antes sob
qualquer aspecto da palavra maldita. Nunca pensaria ou diria “maldita” viagem
por mais desgastante que fosse. Aplicar a palavra “maldita” condenaria a viagem
e o projeto por muito tempo. Por isso, a palavra bendita vem em primeiro lugar
e com essa palavra ele rumou para Carrancas, município de Buriti. Ele não
dirigiria o carro. No máximo, passaria a maior do tempo conversando ou
dormindo. Mandaram-se depois do meio-dia. Com pressa, o motorista não almoçara.
Pararam em Santa Rita e comeram, cada um, um suco e um bolo. O Vicente de
Paula, morador de Carrancas, não os esperava. Ele guardaria os implementos
agrícolas em sua casa até que os demais participantes do projeto buscassem. A
dona Maria das Dores, moradora da Bacaba, aguardava o material desde setembro e
provavelmente cobraria a demora. Alguém da família de dona das Dores teria que
buscar o material na casa do Vicente. Eles não entregariam os materiais,
pessoalmente, porque as comunidades se dispersam pela Chapada e pelos Baixões.
A comunidade
de Brejinho mora num Baixo que é cortado por um afluente do rio Munim. Para
chegar a ela, atravessam-se vários mata-burros e a pessoa desce uma ladeira que
não é para qualquer um. Vale a pena se assombrar com Brejinho e seus
buritizeiros depois de encarar a Chapada queimada para que nasça o capim que
alimentará o gado. O Nego, morador de
Brejinho, incumbiu-se sozinho da construção do galinheiro. Os seus vizinhos se
desvencilharam da idéia do galinheiro. Há mais ou menos um mês atrás ele aparecera
na casa do Vicente. Desde então, dedicara-se a pegar madeira na Chapada e no
Baixo para construir a casinha onde os frangos serão criados. A conversa do
Nego se entrecorta ou arrasta-se pelas suas agruras. Ele se surpreendera com a
noticia que trouxeram os frangos caipiras e que ele deveria ir a casa de
Vicente para pega-los. Algo extraordinário se desprendia da surpresa dele. O
Nego alegava que não terminara o galinheiro, mas que só tardaria uns dois dias
para ele terminar o serviço.
O Francisco,
vizinho do Vicente, também se surpreendeu com a noticia dos frangos caipiras de
manhã bem cedo. No desenrolar da conversa, ele comentou sobre o eucalipto e de
como a espécie suga a água do lençol freático que pediria auxilio ao Vicente
para definir os limites de sua área; e para encerrar a conversa, ele puxou o assunto
em que dava conta que o André, plantador de soja da região, não obteve as
licenças ambientais para desmatar um trecho que vinha da Laranjeira e que
chegava até bem perto dele e do Vicente.
Mayron Régis
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