quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Capão Grande : a quem se destina as terras do Baixo Parnaiba maranhense



O Moca é um dos moradores do povoado Capão Grande, município de Buriti, Baixo Parnaiba maranhense. A sua família e a família Feitosa disputam mais de 400 hectares de Chapada com a empresa Fanip Agricola, sediada em Fortaleza e que planta eucalipto e soja em propriedades que se espalham pelo município de Buriti e pelo município de Brejo. Segundo consta na ação reivindicatória proposta pelo advogado da Fanip Agricola, a senhora Patricia Otoch Baquit, proprietária da Fanip, detém a posse há mais de 12 anos e exerce o domínio há mais de sete anos do imóvel denominado Fazenda Capão Grande e que, no dia 18 de agosto de 2011, a família Moca e a família Feitosa invadiram a sua propriedade e que nela construíram casa e roubaram madeira. Na ação, o advogado pede ao juiz que conceda a antecipação dos efeitos da tutela, quer dizer, resguardar o direito da requerente. O juiz Cristiano Simas de Sousa, da comarca de Chapadinha, deu continuidade ao processo e determinou um prazo de quinze dias para que as duas famílias contestassem as alegações apresentadas pelo advogado da Fanip. Caso não houvesse contestação, o Juiz concluiria que as pretensões da Fanip sobre os 400 hectares estariam corretas e ordenaria a desocupação da área. O advogado da Fanip entrou com o pedido de tutela antecipada no começo de janeiro de 2013 e o juiz Cristiano assinou a intimação vinte dias depois. Por que o juiz Cristiano se apressou tanto em assinar a intimação? Ele pressentiu algo de urgente a partir da leitura da ação da empresa? A própria narração feita pelo advogado da empresa desfaz essa interpretação de urgência assumida pelo juiz. O advogado escreve, caso seja verdade, que a família Moca e a família Feitosa invadiram a fazenda Capão Grande em 18 de agosto de 2011. Da invasão para o pedido de tutela antecipada, passaram-se dezessete meses. Então, por que de repente a Fanip entra com um pedido de tutela antecipada? A empresa responde a pergunta: “...a autora está necessitando de seu imóvel, pois tem vários projetos para ser implantados no imóvel, encontrando-se inviabilizados em decorrência da invasão da propriedade pelos réus, de forma clandestina.” Os projetos a que se refere o advogado da Fanip são os plantios de soja e de eucalipto que a senhora Patricia pretende ampliar e ela mira com olhos grandes os 400 hectares do Capão Grande .

Os moradores retiram madeira, acusa o advogado da empresa que incluiu no processo uma certidão de ocorrência. Ora, em dezessete meses, os moradores do Capão Grande teriam retirado tanta madeira que daria para montar uma serraria e estariam bem de vida e o advogado só inclui uma ocorrência?!!! Não há como levar a sério a urgência de última hora da empresa e do juiz Cristiano. Quer dizer, há de se levar a sério porque a comunidade do Capão Grande se alvoraçou toda para entender o que estava escrito naquele papel entregue por um oficial de justiça. Os moradores se horrorizaram, ao lerem que, caso não respondessem as acusações de invasão e de retirada de madeira, teriam que desocupar o lugar onde moravam. Por certo, que ao assinar a intimação, o juiz não pensou duas vezes, mas os moradores pensaram muitas vezes o que fazer após receberem o papel das mãos do oficial de justiça. Como contratariam um advogado? Eles solicitaram ajuda ao STTR de Buriti que, pelo seu lado, pediu assistência a assessoria jurídica da Fetaema. Os advogados da Fetaema entraram com um agravo de instrumento junto ao Tribunal de Justiça para que refizesse a decisão do Juiz Cristiano de Chapadinha sob a alegação de que os moradores estão na área há tanto tempo e que se consideram uma unidade familiar camponesa, também constituída por mulheres, crianças e idosos. Os desembargadores acataram os argumentos dos advogados da Fetaema e refizeram a decisão do juiz Cristiano.

Nem a decisão do juiz Cristiano e nem a decisão do TJ entram no mérito de quem é realmente dono do Capão Grande, mas a do TJ corrige uma injustiça que a intimação assinada pelo juiz Cristiano guardava em si. O juiz Cristiano acolheu as argumentações da Fanip porque estavam expressas em linguajar de advogado e porque transpareciam um pedido de justiça como se a Patricia Otoch fosse uma pobre coitada enfrentando um grupo de invasores e de ladrões de sua propriedade. A decisão do TJ abre um precedente para que se discuta a quem se destina as terras do Baixo Parnaiba maranhense.

 

Mayron Régis

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