"A população, sobretudo a parcela mais carente e que
vive em áreas afastadas, utiliza várias plantas para curar diversas
doenças, mas quase nenhuma dessas espécies foi estudada química e
farmacologicamente", diz a autora do trabalho, a química Juliana Rodrigues. Ela fez a investigação durante seu doutorado no IQ, concluído no ano passado, sob a orientação do professor Wagner Vilegas, que lidera um grupo de estudos na Unesp sobre produtos naturais. Atualmente, ela realiza pós-doutorado na Universidade Estadual de Maringá, no Paraná.
A pesquisa analisou as plantas Miconia rubiginosa e
Miconia stenostachya. Ela empregou o método quiral, usado pela primeira
vez em bioprospecções realizadas no Projeto Biota - Fapesp (Programa de
Pesquisas
em Caracterização, Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade do
Estado de São Paulo), do qual o estudo faz parte. Ela também usou
o método geral de isolamento e identificação, que é adotado por todas as
investigações do Biota. Juliana explica que o modelo escolhido depende
principalmente da natureza das substâncias que se quer analisar, neste
caso, as catequinas, um fitonutriente com ações benéficas
antioxidantes e anti-inflamatórias.
Uma das preocupações da investigação era detectar a
presença de enantiômeros (moléculas que são imagens no espelho uma da
outra e que algumas vezes têm efeitos opostos, como gêmeos 'bom' e
'mau'). Durante muito tempo, a ciência acreditou que as plantas
produziam apenas um dos enantiômeros, isto é, apenas o ativo que tinha
um efeito esperado. Entretanto, segundo explica a cientista, diversos
trabalhos têm demonstrado que algumas espécies têm ambos os
enantiômeros. Assim, o uso de um vegetal não pesquisado pode fazer bem
para um determinado fim e atingir o organismo noutra área.
Medicamentos também podem apresentar essas diferenças.
O caso mais grave e mais conhecido é o da talidomida. Esse fármaco foi
comercializado para enjôo em mulheres grávidas, mas foi responsável
por milhares de casos de bebês nascidos com deformações. O problema
ocorrido foi que um dos enantiômeros desempenhava a atividade desejada,
e o outro tinha ação teratogênica, que causa alterações no
desenvolvimento de fetos.
Risco de extinção
Nas plantas analisadas, Juliana detectou apenas os
enantiômeros mais comuns de uma série de substâncias isoladas para fazer
parte do grupo de derivados de catequinas. Isso significa que a planta
não ofereceria, a princípio, risco de uma ação adversa. A Miconia
rubiginosa é usadas pela população para gargarejos contra dor de
garganta, e pela semelhança com essa espécie, a Miconia
stenostachya pode ter a mesma utilidade.
Confirmado o potencial fitoterápico dos vegetais e
garantida a segurança do seu uso, o estudo alerta para um outro risco: a
perda da biodiversidade. "Muitas plantas do Cerrado têm seu potencial
desconhecido pela ciência. A degradação ambiental desse bioma pode
extinguir essas espécies antes de o seu valor farmacológico se tornar
público", afirma.
Por Cínthia Leone da Assessoria de Comunicação da Unesp
www.univesp.ensinosuperior.sp.gov.br
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