Nenhum outro lugar apascenta a alma como o leito do rio Preguiças. As comunidades extrativistas do Baixo Parnaíba aguardam o expressivo instante para o banho providencial. Os adultos asseiam as crianças que teimaram em vigiar os passos. Na primeira tarde, antes do curso “O Cerrado que protege”, o agricultor familiar Zé Crispim, ex-presidente da associação de Mangabeirinha, descerrou parte da Chapada que jazia em disputa entre a associação e os parentes dos associados que intencionam vendê-la provavelmente para a Suzano. Um ex-vereador e ex-presidente do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Urbano Santos demarcou uma área como posse e vendeu para a Suzano. Essa área corresponde a duzentos hectares de Chapada e nela a comunidade leciona a coleta de bacuri entre dezenas de bacurizeiros.< /p>
Na porta da casa do seu Zé Crispim, povoado de Mangabeirinha, município de Urbano Santos, a conversa versava sobre reuniões, projetos, publicações e agressões que chegaram a ele, a sua comunidade e ao rio Preguiças por meio de outros indivíduos e por meio de empresas. Um pouco menos de vinte anos atrás, a Paineiras aterrou um trecho onde o rio Preguiças se aconchegava como as pessoas se aconchegam na beira do rio na hora do banho.
As empresas de reflorestamento com eucalipto como a Paineiras, que recentemente se adestrou ao nome de Suzano Papel e Celulose, flagelizam os recursos hídricos como o rio Preguiças ao simplesmente recorrer à captação de suas águas para misturar com veneno que será aspergido nas suas áreas de reflorestamento. O seu Zé Crispim citou casos de funcionários das terceirizadas que vergastam áreas próximas a Mangabeirinha e que apresentaram indícios de adoecimento pelo contato com os venenos e pela exposição aos raios solares. Até as mudas de eucalipto mirraram com o excessivo calor na região do Baixo Parnaiba.
O seu Zé Crispim desposou uma senhora que se tornou parteira. Essa não é uma profissão fácil. Alguns nem acham que seja profissão. A Associação de Parteiras de Urbano Santos quer tirar isso a limpo ou quer se livrar dos preconceitos que cercam as parteiras. Ele se acantonara sob o projeto “Cerrado que protege” com poucas informações, mas se destacaria de manhã cedo para acompanhar a reunião junto com sua esposa e as outras parteiras. Estas se despacharam de suas comunidades: Surrão, Cajazeiras, Baixa do Cocal e de Mucambo. Em Mangabeirinha, o rio Preguiças as adotaria em seus recantos assim como o Zé Crispim e sua esposa as adotaram em sua casa.
Quanto vale uma Chapada? Os movimentos intensos de caminhões das empresas terceirizadas da Suzano Papel e Celulose nas Chapadas próximas à comunidade de Mangabeirinha, município de Urbano Santos, insinuam que o que vale não é a terra em si e nem o que havia sobre ela e sim o que se enterra dentro dela e o que se puxa pra fora dela. As empresas reflorestadoras como a Suzano e os plantadores de soja pesquisam na internet imagens sobre possíveis áreas para comprar no Baixo Parnaiba e o município de Urbano Santos e suas comunidades extrativistas adoecem com seus rios envenenados como no caso dos rios Mocambo, Boa Hora e Preguiças . O curso “O Cerrado que protege”, organizado pela Associação de Parteiras e pelo Fórum Carajás e financiado pelo Centro de Apoio Sócio A mbiental (Casa), contraiu e descontraiu a comunidade de Mangabeirinha para a prática da alimentação saudável que permite as gestantes uma gravidez rica em vitaminas. A Chapada persiste em frutos como o Bacuri, o Pequi e a Mangaba. Os moradores de Mangabeirinha persistem e os membros do Fórum Maranhense de Segurança Alimentar atestaram isso ao almoçarem galinha caipira e beberem suco de bacuri.
Mayron Régis, colaborador e articulista do EcoDebate, é assessor do Fórum Carajás.
EcoDebate, 30/04/2010
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