A
vulnerabilidade dos quilombolas, dos povos e comunidades tradicionais de
matriz africana e dos ciganos exige um esforço diferenciado na defesa e
promoção dos seus direitos. O fortalecimento da atuação dos Defensores
Públicos nas questões referentes aos direitos dessas comunidades é o
objetivo dos cursos de capacitação que a Secretaria de Políticas de
Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) e a Defensoria Pública da União
(DPU) realizam, com participação de representantes desses segmentos. A
IV Edição do Curso de Capacitação para Defensores Públicos e Operadores
do Direito acontece de 20 a 24 de agosto, em São Luís,
no Maranhão e visa qualificar os profissionais do direito e criar
insumos para a construção de um manual de mediação de conflitos em
comunidades tradicionais.
A parceria entre SEPPIR e DPU foi
iniciada em 2009. Desde então, foram capacitados 149 Defensores
Públicos, nas três edições anteriores do curso. Os participantes são
convidados a partir de edital e convite (e-mail com regulamento) e, no
caso de ultrapassar o número de vagas, é feito sorteio. A capacitação
representa um esforço para melhorar e tornar mais eficar a assistência
jurídica a essas comunidades, e, do ponto de vista profissional, uma
oportunidade de alargar os horizontes de cada Defensor Público pelo
conhecimento agregado e pela experiência social e humana que a
capacitação possibilitará.
“A assistência a grupos tradicionais
consiste num aprendizado constante ao profissional do Direito. É
impossível ser fiel a demandas de grupos quilombolas sem minimamente
adentrar em seu modo de pensar e de entender o mundo e a si mesmos, sem
buscar compreender sua peculiar forma de relacionamento com o meio
ambiente e com a cultura de descendência africana. O maior desafio
parece ser converter a rica experiência e os valores de grupos
tradicionais em argumentos juridicamente válidos à defesa de seus
interesses”, afirma Yuri Costa, Defensor Público Federal no Maranhão,
titular do Ofício de Direitos Humanos e Tutela Coletiva e mestre em
Ciências Sociais pela Universidade Federal do Maranhão.
Yuri Costa destaca que a legislação
sobre o tema, além de recente, é marcada por categorias ainda não muito
bem definidas pela jurisprudência, por vezes preenchidas, quer no âmbito
administrativo, quer no Poder Judiciário, “por posicionamentos
preconceituosos ou intolerantes com relação a uma experiência cultural e
histórica tão antiga quanto desconhecida”.
Segundo Costa, no Maranhão, as
comunidades procuram a Defensoria Pública da União por três principais
razões: obter orientação quanto ao procedimento de certificação como
comunidade quilombola, para que a Defensoria preste assistência jurídica
no processo administrativo ou judicial de regularização de terras
ocupadas tradicionalmente pela comunidade; e para obter auxílio em
demandas decorrentes de projetos de grande impacto socioambiental.
“A certificação, regra geral, é obtida
administrativamente junto à Fundação Cultural Palmares sem grandes
dificuldades, já que tem como base o autorreconhecimento e possui um
procedimento relativamente célere e simplificado”, adianta. Já a
regularização de terras tradicionais depende da agilidade de
procedimento junto ao INCRA, e esbarra na resistência de particulares
que, legítima ou irregularmente, se apresentam como proprietários da
terra e na exigência legal de uma consistente base antropológica a
caracterizar a tradição do grupo quilombola e a extensão das terras
ocupadas. “Isso tudo torna o processo regularização de terras algo
extremamente moroso e não raras vezes marcado pelo conflito e violência
no campo”, acrescenta.
Avanço na legislação
A secretária de Políticas das
Comunidades Tradicionais, Silvany Euclênio, destaca o avanço na
legislação e a importância de um atendimento jurídico diferenciado às
comunidades tradicionais, considerando sua vulnerabilidade para a lide
com o Estado, e também para o controle social das políticas públicas. “A
especialização destes operadores do Direito nas especificidades que
envolvem as comunidades quilombolas, as comunidades tradicionais de
matriz africana e os povos de cultura cigana é importante para
potencializar o atendimento que já é prestado a esses segmentos
populacionais. A Defensoria tem sido importante parceira na promoção e
defesa dos direitos desses grupos, secularmente discriminados. Com mais
essa edição do curso, essa parceria tende a ser mais profícua”, afirma.
Entre os pontos mais importantes do
programa do curso, estão o Racismo no Brasil e os Institutos Legais,
Comunidades Quilombolas e Políticas Públicas, Regularização Fundiária e
Certificação: Avanços e Desafios, Conflitos em Territórios Quilombolas e
Experiências Institucionais (reunindo informações provenientes de
órgãos como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária –
Incra, Advocacia Geral da União – AGU, Ministério Público Federal – MPF e
DPU). Completam a programação os temas Racismo no Brasil e o Advento do
Estatuto da Igualdade Racial, Programa Brasil Quilombola e Titulação
das Terras Quilombolas, entre outros.
Sobre a parceria SEPPIR e DPU
A parceria entre a SEPPIR e a DPU tem
por objetivo o fortalecimento da atuação dos Defensores Públicos nas
questões referentes à defesa e promoção dos direitos das comunidades
quilombolas. Essa parceria foi oficializada em Acordo de Cooperação,
assinado em 2010. Os dois órgãos firmaram novo Acordo de Cooperação em
2012, incluindo como público-alvo, para além das comunidades
quilombolas, outros povos e comunidades tradicionais, cuja
vulnerabilidade exige um esforço diferenciado na defesa e promoção dos
seus direitos. São os Povos de Cultura Cigana e os Tradicionais de
Matriz Africana, também chamados Povos de Terreiro, ambos reconhecidos
pelo Decreto 6040/2007.
As atividades de formação serão
realizadas por região do país. Em 2012, as capacitações abarcarão as
regiões Nordeste e Sudeste, pela densidade dos Povos e Comunidades
Tradicionais, e também pela proliferação de situações de conflito. As
demais regiões, ou seja, norte, centro-oeste e sul deverão ser
contemplados em 2013.
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