Abaixo, a carta retirada do encontro em
São João do Paraíso, região afetada pela monocultura de eucalipto, que
discutiu a expansão da Veracel Celulose e a emissão da licença prévia
ilegal concedida pelo estado da Bahia, a “Terra de todos os NÓS”.
CARTA DOS ATINGIDOS PELA EXPANSÃO DA VERACEL, SUZANO E FÍBRIA NA BAHIA.
É com pesar que as entidades que compõem
os fóruns: SOCIOAMBIENTAL DO EXTREMO SUL, SUL e SUDOESTE DA BAHIA; O
FÓRUM DE LUTA POR TERRA, TRABALHO E CIDADANIA DA MICRO REGIÃO SUL E O
VICARIATO SUL DA DIOCESE DE ITABUNA recebem a notícia: “Estado concede
licença ambiental para expansão da VERACEL”.
Reafirmamos que são vários os motivos que levam os signatários desta carta a lastimarem tal decisão:
MOTIVO 1.
A licença anterior concedida a VERACEL, de 1993, foi anulada pela Justiça Federal,
embora a empresa tenha recorrido da decisão. De qualquer forma o Juiz
Federal declarou “NULAS AS RESOLUÇÕES do CEPRAM” que licenciou o
empreendimento, condenando a “VERACEL A RESTAURAR TODAS AS ÁREAS
COMPREENDIDAS NAS RESOLUÇÕES CEPRAM 707/93, 1.115/95 e 1.235/96, no
prazo de 1 ano, com o plantio de vegetação nativa do bioma da Mata
Atlântica, sendo que nos PROJETOS SUCUPIRA, INHAÍMA II deverá “a VERACEL
retirar a floresta de eucalipto e recompor a área com vegetação nativa
do bioma”, no prazo de três meses, enquanto nos “projetos Inhaíma III,
JACARANDÁ I, LIBERDADE, e SAPUCAIA, o prazo para retirada dos eucaliptos
e plantio de vegetação nativa será de 6 (seis) meses”. Além disso, a
VERACEL foi condenada a “PAGAR R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de
reais), a título de danos ambientais” praticados nessas áreas, e multa
de dez mil reais por dia, caso não retire os eucaliptais e replante a
Mata Atlântica nas áreas citadas. Portanto, desde essa decisão está
firmado o entendimento judicial de que a competência para licenciar
esses empreendimentos é do IBAMA, e não do órgão ambiental da Bahia.
Assim, para a sociedade civil vitimada
pela irregular expansão da monocultura de eucaliptos continua valendo a
decisão de suspensão da Licença Ambiental de 1993.
MOTIVO 2.
Há um estudo do próprio Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Estado da Bahia (INEMA), datado de 2008, que enumera diversas irregularidades da empresa, apontando uma “completa “falta de governança para lidar com a situação”. Conforme o estudo,
“não há ordenamento nem zoneamento do território; não há coordenação
das intervenções públicas relativas aos plantios de eucalipto na região;
não há políticas agrícolas, não há políticas fundiárias; não há
controle da legalidade da venda de terras; não há estudos/normas
específicas estabelecendo índices recomendáveis de ocupação para as
plantações por municípios”.
MOTIVO 3.
O Relatório de Impacto Ambiental de ampliação da VERACEL Celulose (Cepemar, 2009) é um documento fraco e cheio de vícios.
Os problemas antecedem a sua própria elaboração. Os Termos de
Referência, que definem os aspectos a serem contemplados pelo EIA/RIMA e
que devem ser discutidos e elaborados democraticamente, não foram
disponibilizados ao público.
Inúmeras falhas metodológicas,
conceituais e até ortográficas caracterizam o EIA-RIMA do VERACEL II,
sendo injustificáveis as omissões, as imprecisões graves, os termos
vagos e genéricos deste documento. Esse Estudo abandona,
deliberadamente, a análise do projeto em si, e suas relações com o
território, ocupando mais de cem páginas com dados agropecuários,
demográficos, educacionais dos 17 municípios que compõem a área de
influencia direta do projeto. Apenas na parte final, últimas 25 páginas,
são descritos, de forma resumida e precária, os impactos do projeto e
algumas medidas mitigatórias. O “estudo” é marcado por frase do tipo “a VERACEL usa tecnologia em favor do meio ambiente” ou objetiva a “sustentabilidade do empreendimento”.
Enfim, o EIA-RIMA mais se assemelha a um relatório corporativo,
procurando apresentar uma imagem de empresa sustentável.
Definitivamente, o EIA-RIMA não preenche minimamente os itens básicos
prescritos na resolução do CONAMA N° 001 de 23.01.1986.
MOTIVO 4.
Nesse sentido, a análise feita pelo Relatório de Análise de EIA/RIMA do Projeto de Expansão da VERACEL, elaborado
por cinco técnicos do INEMA, elenca diversas inconsistências e
fragilidades do Projeto que ameaçam o meio ambiente de nossas regiões,
tais como:
- “A carência de instrumentos de
planejamento territorial a exemplo do zoneamento Econômico Ecológico
(ZEE) e de leis municipais que estabeleçam o ordenamento do uso do solo
ou de outros instrumentos de que permitam situar e entender de forma
segura, as potencialidades e as vantagens comparativas da várias formas
de uso e ocupação dos diferentes recortes espaciais desses territórios
municipais”.
- No estudo não há detalhamentos
relativos aos plantios de novas áreas. O documento apenas cita que a
base florestal será ampliada em “áreas exclusivamente de pasto”. “O
EIA não apresenta, contudo, qualquer espacialização clara
(poligonais/georreferenciamento) das novas áreas pleiteadas” necessária
“para se estabelecer um compromisso balizador sério desta expansão”.
Diante disto, os técnicos do INEMA, observaram que, “na prática,
estaria se adotando um estranho princípio metodológico, licenciando uma
área teórica, identificada apenas em termos de sua extensão global
máxima nos municípios, sem quaisquer informações detalhadas sobre
aspectos de maior relevância, os quais poderiam, eventualmente, e após
análise mais acurada, condicionar reduzir ou mesmo impossibilitar o seu
licenciamento em alguns municípios”.
- A análise dos técnicos constata também
que, “como informado pela empresa, a cada 2 hectares adquiridos a
silvicultura ocupa apenas 1 ha”. Assim, considerando apenas os plantios
em terras próprias da empresa, suas plantações atuais e futuras (VERACEL
I + VERACEL II) somariam “cerca de 180 mil hectares”. Por isso, os domínios da VERACEL alcançariam “376 mil hectares, ou 16% das terras de extensa região (17 municípios), causando uma grande concentração” fundiária.
MOTIVO 5.
Os participantes dos Fóruns signatários também repudiam o Termo de Ajustamento de Conduta – TAC
celebrado entre Ministério Público Estadual (MPE) e as empresas de
celulose do extremo-sul da Bahia (FIBRIA e SUZANO) além de terceiros
intervenientes, uma vez que as punições aplicadas às empresas do setor
se alongam há mais de 20 anos dado o modelo de exploração predatória
continuada cujo resultado são a perda da biodiversidade em toda as
regiões que se instalam. As “punições”, na prática, são esquecidas
mediante o pagamento de quantias irrisórias quando comparadas ao
faturamento das empresas do setor ou mesmo MULTAS NÃO PAGAS pela empresa
apesar da gravidade das atuações delituosas. Ademais, na negociação do
TAC, o MPE ignorou as entidades da sociedade civil regional que
realizaram as denúncias, possibilitando o acordo mencionado no TAC e
acolhendo como “terceiros intervenientes” no processo entidades e
empresas consideradas “amigas” ou “co-irmãs” das empresas de celulose.
Por tudo isto, denunciamos esses fatos ao Conselho de Procuradores do MPE,
esperando a anulação das cláusulas do TAC celebrado pela Base Ambiental
Costa das Baleias, que implicam na redução das penas anteriormente
cominadas aos degradadores do meio ambiente, inclusive com repercussões
favoráveis às empresas coligadas ou vinculadas ao mesmo grupo econômico
da VERACEL.
REIVINDICAÇÕES:
Pelas razões expostas, e considerando o dispositivo constitucional,
segundo o qual “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo
e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (CF, art. 225), os fóruns mencionados, através de suas entidades, e outros parceiros do Brasil e de outros países, vêm EXIGIR das autoridades competentes as providências abaixo:
1. A ANULAÇÃO DA LICENÇA PRÉVIA DO PROJETO DE EXPANSÃO DA VERACEL CELULOSE para todas as regiões do Estado da Bahia, especialmente, da região Sul, Extremo Sul e Sudoeste da Bahia;
2. A REVISÃO, PELO CONSELHO DE PROCURADORES DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL,
do TAC – Termo de Ajustamento de Conduta celebrado pela Base Ambiental
Costa das Baleias com as empresas SUZANO e FÍBRIA e com interveniência
das empresas certificadoras SYSFLOR – CERTIFICAÇÃO DE MANEJO E PRODUTOS,
IMAFLORA – INSTITUTO DE MANEJO E CERTIFICAÇÃO FLORESTAL E AGRÍCOLA,
FUNDAÇÃO JOSÉ SILVEIRA E LABORATÓRIO DE ECOLOGIA E RESTAURAÇÃO
FLORESTAL, especialmente, por não haver representação da sociedade civil
não empresarial DO MOVIMENTO POPULAR (tripartite e paritária) sobre o
pagamento de multas na esfera administrativa (IBAMA e INEMA e órgãos
antecessores), cível e penal, caso existam;
3. A SUSPENSÃO IMEDIATA DO PLANTIO DE ESPÉCIES EXÓTICAS – EUCALIPTO – NO ESTADO DA BAHIA, dada
à saturação de áreas plantadas que comprometem o uso múltiplo dos
Territórios Sul, Extremo Sul e Sudoeste da Bahia em face da inexistência
de Zoneamento Ecológico Econômico – ZEE;
4. A REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIAS PÚBLICAS E OFICINAS DE ELABORAÇÃO DE PLANO DIRETOR DO TERRITÓRIO E DO ZEE,
para que todos os segmentos que compõe a sociedade civil colaborem com
as decisões de efetivação dos instrumentos públicos de gestão. A
ANULAÇÃO da Licença Prévia do Projeto de Expansão da VERACEL CELULOSE
para as regiões Sul, Extremo Sul e Sudoeste da Bahia.
5. O REDIRECIONAMENTO DOS INVESTIMENTOS DO BNDES
e demais bancos nacionais à Agricultura Familiar e à demarcação e
titulação das terras das Comunidades Tradicionais – Indígenas,
Quilombolas e Ribeirinhas, com proteção dos direitos humanos e subsídio
garantido à Soberania Alimentar dos atingidos pelo agronegócio e grandes
obras mantidas pelo Governo Brasileiro.
São João do Paraíso – Mascote, 21 de abril de 2012.
- FÓRUM SOCIOAMBIENTAL DO EXTREMO SUL, SUL E SUDOESTE DA BAHIA.
- FÓRUM DE LUTA POR TERRA, TRABALHO E CIDADANIA DA MICRO REGIÃO SUL
- VICARIATO SUL DA DIOCESE DE ITABUNA – BAHIA
- 1. Centro de Estudos e Pesquisas para o Desenvolvimento do Extremo Sul – CEPEDES
- 2. Centro de Estudos e Ação Social – CEAS
- 3. Comissão Pastoral da Terra – CPT
- 4. Conselho Indigenista Missionário – CIMI
- 5. Associação dos Advogados dos Trabalhadores Rurais – AATR
- 6. FUNPAJ – Fundação Padre José Koopmans
- 7. Projeto Balcão de Direitos da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB
- 8. RESEX – Reserva Extrativista de Una e Canavieiras
- 9. ARES – Associação para o Resgate Social
- 10. Cooperativa Agropecuária de Una
- 11. CETA – Movimento de Trabalhadores Assentados, Acampados e Quilombolas da Bahia
- 12. APLB – Associação dos Professores Licenciados do Estado da Bahia – Delegacia de Mascote
- 13. Associação dos Assentados do Poxim-Sarampo – Canavieiras
- 14. AMEX – Associação mãe dos extrativistas da Resex de Canavieiras
- 15. CDDH – Centro de Defesa dos Direitos Humanos do Extremo Sul da Bahia
- 16. STR ITANHÉM E VEREDA – Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itanhém e Vereda
- 17. Instituto Búzios
- 18. Centro de Desenvolvimento Agroecológico do Extremo Sul da Bahia – TERRA VIVA
- 19. SINDICATO DOS BANCÁRIOS DO EXTREMO SUL DA BAHIA
- 20. GAMBÁ – Grupo Ambientalista da Bahia
www.forumcarajas.org.br
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