Por Fabiana Vezzali
Um exército de trabalhadores rurais,
principalmente da Região Nordeste, lança-se, ano após ano, safra após
safra, em migrações por um serviço que possa garantir o sustento de suas
famílias. Na maioria absoluta dos casos, são obrigados a suportar a
dolorosa distância, sem direito de conviver em seus respectivos lares.
Diante dessas circunstâncias, a possibilidade de arrumar empreitadas
temporárias em áreas próximas de casa parece se apresentar como o
“melhor dos mundos”: garantia de fonte de renda sem ter de abandonar
entes queridos. O caso de União (PI) mostra, porém, que nem sempre as
coisas são tão simples assim.
As opções de emprego proporcionadas
pelos canaviais que se espalham ao redor do município piauiense trazem
consigo não apenas oportunidades, mas também outras preocupações
esmiuçadas por aqueles que são, estão e pretendem continuar na região.
Antonio Osmar da Silva é cortador de
cana em União (PI), que fica a 60 km da capital Teresina (PI). Aos 47
anos, Antonio mora com a família na comunidade rural de Maniçobal e já
viajou diversas vezes a outros Estados em busca de trabalho. No início
de 2011, partiu com alguns colegas para cortar cana-de-açúcar em São
José da Laje (AL). O transporte foi feito com a supervisão do sindicato.
Foram quatro ônibus lotados. Ao chegar lá, contudo, Antonio não se
adaptou e logo voltou. “O alojamento era bom, mas o lugar era muito
ruim. A cana era carregada no burro. Usava carro de boi para arar.
Tratavam a gente só na humilhação. Recebi R$ 100 e voltei”.
Assim como muitos outros migrantes que
costumam atuar no setor sucroalcooleiro, Antonio acompanha os novos
ciclos e desbrava fronteiras de expansão da cana no país. No ano
passado, esteve em Mato Grosso. “Vim embora porque a gente sente
saudade”, comenta. Diz que a viagem a Alagoas foi a última e que não
pretende procurar trabalho em outros locais. A esposa, Martinha Tomé
Borges da Silva, comemora a decisão. “Já falei para ele que, cana por
cana, é melhor ele cortar aqui mesmo. Não vai atrás de melhora, porque
não ganha melhora, só ganha piora. Não consegue juntar para trazer para
casa, gasta na passagem ou lá mesmo.”
O Índice de Eficácia Migratória do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que, de
1995 a 2000, o Estado do Piauí situou-se num patamar de alto grau de
repelência. O índice é medido numa escala de – 1 a + 1, sendo que o
indicador do Estado no período foi de – 0.23. O índice faz relação entre
o número de migrantes no Estado e o volume total de migrantes no País
(de modo proporcional à população de cada local). Quanto mais próximo de
+ 1, mais atrativo para migrantes é o Estado. E quanto mais próximo de –
1, mais o Estado repele pessoas. Próximo a zero, o indicador aponta
neutralidade, sem tendência mais consolidada. Entre 1999 e 2004, o Piauí
apresentou uma situação neutra quanto ao indicador (de 0,02), sendo que
entre 2005 e 2009 voltou a apresentar um grau de Estado que repele
muito, com – 0,17.
Contextualização
Localizada na divisa com o Maranhão,
União (PI) situa-se numa região na qual babaçuais são obrigados a
competir com as lavouras de cana. A cidade enfrenta as oportunidades e
os problemas de localidades em áreas de grande expansão de monoculturas.
A presença de uma única planta industrial de álcool e açúcar de grande
porte influencia a dinâmica econômica local. A usina Comvap Açúcar e
Álcool Ltda. faz parte do grupo pernambucano Olho D’Água e, segundo a
empresa, é a maior produtora estadual.
A empresa não quis fornecer informações
sobre o número de funcionários, mas o Sindicato dos Trabalhadores Rurais
(STR) de União (PI) estima que a soma chegue a 2 mil cortadores no
município, que tem cerca de 42 mil habitantes. Ou seja, cerca de 5% de
toda a população trabalharia para a Comvap – número que seria ainda mais
alto se considerada somente a População Economicamente Ativa (PEA).
“Quem não trabalha com cana, trabalha
com agricultura familiar, onde tiver espaço”, completa João Francisco da
Silva, presidente do STR local. Os dirigentes enumeram casos de venda
de pequenas propriedades para a produção de cana. Frente ao esquálido apoio à agricultura familiar, algumas famílias preferem arrendar terra para a cana em detrimento de outras lavouras.
De 2001 a 2006, União despontava como o
município do Piauí em que mais se plantava cana. Em 2006, auge da
produção local na década segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), foram plantados 4,1 mil hectares de cana no
município. Nos últimos quatro anos, contudo, a produção foi reduzida,
passando a figurar na 3ª colocação, logo atrás de José de Freitas (PI) e
Teresina (PI), que apresentaram crescimento na última década e
alternaram-se, nos últimos anos, nas duas primeiras posições em termos
estaduais.
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