Obras portuárias e impactos sociais no Tapajós: interesses econômicos e a obscuridade de informações
Por Pedro Martins*
O impacto já causado por essas empresas, a despeito das violações de direitos humanos ocorridas, é agravado com a negligência do poder público em acionar os mecanismos de compensação e indenização pelos danos causados.
A abertura para novos empreendimentos com as mesmas facilidades de instalação como visto no caso dos portos torna o horizonte dos modos de vida na Amazônia mais difíceis. Em um contexto onde as negociações de concessões públicas a iniciativas privadas não são escancaradas, cada informação será arma valiosa.
*Assessor jurídico da Terra de Direitos.
Por Pedro Martins*
As frentes de expansão capitalista
tornaram o Rio Tapajós, no Oeste do Estado do Pará, constante alvo de projetos
de desenvolvimento que visam alterar drasticamente a paisagem local, as
relações econômicas e sociais, e as formas de trabalho sobre a natureza. Após
intensa extração mineral e madeireira que deixou e ainda deixa resíduos
químicos e sociais ao longo do leito do Tapajós, vislumbram-se no horizonte das
ondas de expansão capitalista novos e mais fortes investimentos empresariais na
região.
As relações entre “patrão” e “peão”, a
pistolagem, grilagem e a apropriação violenta dos recursos naturais, apesar de
antigas, são ainda presentes e convivem com a modernidade dos grandes projetos
do Oeste do Pará. Segundo a Comissão Pastoral da Terra da BR-163, em 2014 foram
resgatados 11 trabalhadores escravos no município de Rurópolis, local
estratégico para os novos investimentos empresariais. É nesse cenário,
aparentemente contraditório, onde ainda resiste parcela significativa do
campesinato amazônico, povos e comunidades tradicionais e aldeias indígenas,
que as relações de opressão, sejam elas antigas ou recentes, se reproduzem.
O novo “ciclo” – que tem como
“abre-alas” o Complexo Hidrelétrico do Tapajós – é marcado por uma série de
empreendimentos de infra-estrutura que objetivam viabilizar, por exemplo, o
avanço dos campos de soja e a aceleração da exploração mineral.
Etapas de consolidação de portos
(Terminais de Uso Privado – TUP’s e Estações de Transbordo de Cargas – ETC’s)
estão sendo realizadas antes da ocorrência do leilão das obras de barragem do
Rio Tapajós, previsto para o segundo semestre de 2015. Pouco discutidas,
essas obras trazem consigo uma promessa de mudanças – muitas delas negativas –
que está cercada pela obscuridade provocada pela falta de informações
disponíveis.
A “saída Norte”, como vem sendo chamada
pelos agronegociadores, deverá diminuir pela metade o custo de escoamento de
grãos, em especial a soja, que dá atualmente apenas por portos localizados na
região Sul e Sudeste. Tal fato atrai empresas que a todo custo tentarão prover
lucros.
Por isso, relatórios técnicos como os
Estudos de Impactos Ambientais (EIAs), necessários para a construção dos
empreendimentos na região, não demonstram os reais prejuízos acarretados por
tais obras.
Exemplo disso é o licenciamento
ambiental das estações de transbordos de megaempresas (como Transportes
Bertonili Ltda, Odebrecht Transport e Companhia Norte de Navegação e Portos –
Cianport) entre os municípios de Rurópolis e Itaituba, que está na etapa de
entrega do EIA à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade –
SEMAS. Os impactos sociais são minorados nos estudos, haja vista, que poderá
ocorrer a tragédia social tal como em Belo Monte (a região apresenta altos
índices de prostituição e exploração sexual de crianças e adolescentes).
Situação semelhante pode ser vista no
projeto Estação de Transbordo de Cargas Santarenzinho, cujo EIA e o respectivo
Relatório de Impacto Ambiental – RIMA foram protocolados (sob o nº 32473/2014)
em 7 de outubro de 2014, na antiga SEMA.
A obra, que será localizado no
município de Rurópolis, é de interesse da empresa Odebrecht Transport S.A. O
Estudo de Impacto Ambietal das estações locais foi elaborado pela empresa de
consultoria Ambientare, gerenciada por Felipe Fleury.
A área de instalação dos terminais e
estações segue a ordem já estabelecida dos Portos hoje em funcionamento das
empresas Cargill, Bunge, Cianport, Chibatão, Unirios e Hidrovias do Brasil, no
chamado distrito de Miritituba, município de Itaituba.
Só o empreendimento da Hidrovias do
Brasil prevê o escoamento de 1 milhão de toneladas de grãos por ano, a partir
de 2017. Com isso, cria estrutura para que as áreas hoje trabalhadas na base da
agricultura familiar sejam substituídas pela monocultura de soja.
Acordos obscuros
A chegada das obras portuárias traz
consigo o potencial de relações empresa-comunidade de novos recortes sociais,
seja no crescimento acelerado de ocupações urbanas sem infra-estrutura,
empregos temporários e alteração da fauna e flora.
A
Zona Comercial Industrial e Portuária (ZCIP) de Itaituba está
estabelecida pela Lei Municipal nº 2.308 de 2012, e prevista no Plano
Diretor da cidade (Lei Municipal nº 1.807/06), que estabelece o
zoneamento do Município. A instalação dessas empresas na cidade deveria
injetar dinheiro em outras obras a cargo da Prefeitura de Itaituba, como
através da compensação ambiental. Mas pouco se sabe do estabelecido
entre empresas e a administração do município para a realização desses
portos.
A Associação dos Terminais Privados do
Rio Tapajós (ATAP), sediada em Belém (e ligada à Birck Logística), e a
Prefeitura de Itatuiba deveriam ter chegado a um acordo para viabilizar a
construção de terminais fluviais no rio Tapajós. O empreendimento bilionário é
considerado um dos mais importantes para o escoamento de grãos do Centro-Oeste
para o mercado exterior. No entanto, não há informações se contrapartidas por
parte das empresas foram totalmente definidas e realmente concretizadas.
Sabe-se que a Fundação Bunge negociou
repasse de verba para a prefeitura de Itaituba, assim como a Cargill Agrícola
S/A firmou Termo de Compromisso com a Secretaria de Meio Ambiente (Termo nº
016/2014-SEMA/PA) em novembro de 2014, à título de compensação ambiental. O
órgão ambiental receberia mais de 1 milhão de reais para a criação de unidades
de conservação em Medicilândia, Senador José Porfírio e Itaituba. Termo
semelhante foi firmado a CIANPORT, no valor de 266 mil reais.
O impacto já causado por essas empresas, a despeito das violações de direitos humanos ocorridas, é agravado com a negligência do poder público em acionar os mecanismos de compensação e indenização pelos danos causados.
A abertura para novos empreendimentos com as mesmas facilidades de instalação como visto no caso dos portos torna o horizonte dos modos de vida na Amazônia mais difíceis. Em um contexto onde as negociações de concessões públicas a iniciativas privadas não são escancaradas, cada informação será arma valiosa.
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