(Mayron Régis*)
Daqui a três anos, não tenham dúvidas, o tempo vai estar bem
quente e seco na ilha de São Luís. Isso, é claro, se os prazos de
implantação do complexo siderúrgico, envolvendo Baosteel, Vale do Rio
Doce e Arcelor, que estão sendo divulgados, forem respeitados. A
Baosteel é a empresa de siderurgia da China e está situada em Shangai,
província chinesa de mais de 200 milhões de habitantes; a Vale do Rio
Doce, multinacional brasileira cujos negócios vão desde mineração,
passando por geração de energia e chega ao transporte de soja; a Arcelor
é uma empresa francesa de fabricação de placas de aço. Elas, junto com o
governo do estado do Maranhão, estão planejando um complexo siderúrgico
que receberá investimentos de quase um bilhão e meio de dólares para
produzir até 2014 cerca de 21 milhões de toneladas de aços planos, em um
processo que deverá ser dividido em 3 módulos de sete milhões de
toneladas.
Existem várias razões concretas para a instalação desse complexo
siderúrgico na ilha de São Luís, razões, essas, que não foram observadas
no estado do Pará que também estava na disputa. Entre essas razões está
a infra-estrutura do porto de Itaqui, onde serão investidos 200 milhões
de dólares, o qual pode receber navios de grande calado. Entra também a
disponibilidade de água doce, pois a ilha de São Luís recebe água do
complexo Italuís, rede que capta água do rio Itapecuru próximo à cidade
de Santa Rita, e que deverá ser duplicado, justamente, para poder
receber o complexo siderúrgico. Para não aparentar que os investimentos
públicos que estão sendo feitos para essa duplicação só acontecem em
proveito de um empreendimento privado, o governo do Maranhão garante que
a crise de abastecimento de água para os bairros residenciais será
resolvida. Aliado à oferta de água, o governo do Maranhão estará
oferecendo uma baita extensão de terra.
Pelo depreendido, a indústria de siderurgia para se viabilizar requer
uma grande oferta de recursos naturais, mas, nesse caso, a vinda para o
Maranhão tem outras razões que podem ser analisadas a partir das
empresas que compõe o consórcio. A China é atualmente o país no mundo
que mais cresce do ponto de vista econômico, com taxas de até 10%, o que
para um mundo que se encontra em recessão são taxas fabulosas. Contudo,
como já era previsível, a China não tem matérias-primas suficientes
para manter essas taxas no patamar em que elas se encontram e garantir
bem-estar material para uma população de mais de um bilhão de
habitantes. A Arcelor, por conta do Protocolo de Kyoto, que obriga os
países da Europa a diminuírem seus níveis de poluição, está planejando
transferir as atividades de 17 usinas de aço para países em
desenvolvimento. A Vale do Rio Doce se coloca como intermediária entre
seus sócios e os governos estadual e federal, para conseguir
financiamento junto ao BNDES, por exemplo. Então, dentro de todo esse
apanhado, o Brasil entra com a matéria-prima e com os financiamentos.
Afora a macroeconomia, onde os agentes privados e públicos fazem as
contas de quanto será gasto e quanto será ganho para si e para as
economias mundial e nacional, o projeto do pólo siderúrgico segue em
segredo, não de justiça. Até hoje, o Ibama regional e a Curadoria de
Meio Ambiente não receberam nenhuma informação sobre o projeto e as
obras de infra-estrutura têm previsão de início para os próximos meses.
As 16 comunidades, cerca de mais de 19 mil pessoas, morando em uma área
de 13 mil hectares, que deverão ser remanejadas ainda não foram
contatadas e estão todas apreensivas com seu destino. Para onde irão
essas famílias? De que forma elas se sustentarão, afinal muitas delas
são pequenos agricultores e pescadores? Apresenta-se, para as
comunidades que serão afetadas pelo pólo, o que todo esse processo, um
processo que na planta industrial de Tubarão demorou vinte anos e que em
São Luís pretendem alcançar em cinco, acarretará para o meio ambiente
da ilha de São Luís?
Provavelmente, após mais de vinte anos de projeto Alumar (Alcoa e
Billiton), a população ludovicense se acostumou com os infortúnios que
foram provocados pela implantação desse projeto e pode até se acostumar
com mais um grande projeto. Contudo, parte dessa mesma população ainda
sofre pela apropriação e pelo cercamento de terras e pela poluição dos
recursos hídricos, que a Alumar vem praticando e vem causando nesses
tantos anos. E ela, com o dinheiro e a influência política que tem,
monta uma outra imagem, como se a produção de alumínio só tivesse
trazido benefícios. Próxima à fábrica, do outro lado da BR-135, a luta
da Associação dos Pequenos Produtores de Aracauá pela posse de 633
hectares, que foram cercados indevidamente pela Alumar, é uma prova
negativa do papel da Alumar.
Ao todo a área que a Alumar cercou e colocou guardas é de 897 hectares.
Ela possui documentos comprovando a posse de 244 hectares. Os outros 633
pertencem a família Serra que está entrando em acordo com a Associação
dos Pequenos Produtores de Aracauá para que esta possa realizar projetos
produtivos (mandioca, fruticultura e pescaria). Os herdeiros têm vários
documentos comprovando a posse, mas a empresa não reconhece. Durante
uma averiguação de retirada de argila e derrubada de babaçuais, esta,
sem autorização do Ibama, nos seicentos hectares em litígio, o
presidente da associação e um dos herdeiros só puderam entrar porque
estavam com a equipe do Ibama.
Pelo visto, essa área é pretendida pela Alumar para poder guardar os
resíduos da produção do alumínio. É a lama vermelha que ela vem
guardando próxima á cabeceira do Igarapé Babilônia.
agosto 2004
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