quinta-feira, 13 de novembro de 2014

A histórica marcha de São Bernardo à Santa Quitéria





Era o ano de 2008, num momento em que os movimentos sociais estavam com gosto de gás, as comunidades da região com orientação do Fórum em Defesa do Baixo Parnaiba, SMDH, CCN, CPT, Fórum Carajás, Diocese de Brejo, Paróquias, em fim... várias entidades e seguimentos da sociedade civil; conseguimos organizar a mais importante das marchas em defesa da vida que partiu da Comunidade Nova Esperança até a cidade de Santa Quitéria.
As caravanas foram chegando a tardinha e se alojando nas casas que ficam na beira da estrada. Lembro que a negada de Urbano Santos chegou por volta das vinte e uma horas e tivemos dificuldades no alojamento, uns ficaram na escola do povoado, outros procuraram quintais e ainda teve pessoas que armaram suas redes nas árvores do pátio. Nessa mesma noite estava acontecendo um arraiá caipira (festas juninas) no povoado, muita música boa, todas regionais, quadrilhão corrido. Alguns companheiros que não conseguiram dormir resolveram ir para a festa, entre esses eu estava lá. A poeira subia com o movimento dos apresentadores no terreiro, o tempo foi passando até dá uma hora da manhã. Como o sono não chegava e a marcha começaria a partir das quatro horas, arrumamos outras amizades com o pessoal da comunidade Inxú que tinham acabado de chegar para participarem do evento. O certo é que as horas passaram sem ninguém da fé. Três e meia, lembro que o professor médico patologista Luís Alves do CCN acordou e fez uma enorme fogueira para anunciar a concentração, foram chegando um, dois, três... em fim, muita gente se aconchegou ao redor da fogueira não pelo fato de já estarem no ponto para a marcha, mas porque o frio estava matando e a preguiça de acordar também juntava-se à ocasião das quatro horas da manhã, o melhor sono. As atividades começaram oficialmente às seis horas com muita neblina, todo mundo na estrada em direção à cidade de Santa Quitéria, nós manifestantes cobrávamos um Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário, faixas apareceram contra o plantio da soja e do eucalipto, gritos, cantigas de comunidades alegravam e davam forças à caminhada pela via direita da estrada. O companheiro Zé Vale de Barreirinhos e membro da SMDH liderava o microfone com suas falas e maneiras de fazer místicas. A imprensa estava também fazendo o seu papel importante de divulgação.
Mas um dos pontos principais das reivindicações foi o problema em que a Suzano Papel e Celulose assumiu as tarefas da Empresa Margusa na época, desenvolvendo sua política suja de intimidação com seus tratores e policiais nas comunidades, querendo ocupar as chapadas... as áreas de Santa Quitéria em processo para fins de reforma agrária, foi daí então que as comunidades deixaram o papel do diálogo e partiram para a resistência do conflito agrário-ambiental e também para o ponto da prática do conhecimento, da importância de participação popular e política. O sol foi esquentando e ficando mais sufocante, chegou um momento para uma parada e falas, a BR foi interditada, nós fizemos um paredão para nenhum carro passar, não era por maldade, mas até mesmos os caminhoneiros saberem que estávamos cobrando dos poderes competentes os seus direitos como cidadãos.  A pista foi liberada e a caminhada continuou firme até chegar na sede do Município de Santa Quitéria mais ou menos umas treze horas, todo mundo com fome e sede. A organização preparou um palanque com apresentações das caravanas, de vários municípios que compõe o Território do Baixo Parnaiba. Membros dos seguimentos populares em defesa dos direitos humanos fizeram seus acentos. Redes de TVs e alguns jornais vieram de São Luís e Teresina-PI para a cobertura dessa marcha que muito rendeu nas conquistas de direitos no Baixo Parnaiba.
Sinto saudades daquela época em que os nossos movimentos estavam fortes; precisamos reerguer essa luta, reativar os grandes encontros de trabalhadores, os seminários, as marchas. O agro-negócio neoliberal está aí, o movimento caiu um pouco mas não morreu. Vamos a luta! “Um outro Baixo Parnaíba é possível, sem soja, sem eucalipto; com frutas e verduras, com as chapadas e sustentabilidade econômica para todas as comunidades tradicionais que ocupam esse território há séculos.”

José Antonio Basto
04/11/2014
militante social dos direitos humanos, Paixo Parnaíba
email: bastosandero65@gmail.com

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