O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou no  último dia 19 de outubro, um estudo sobre o saneamento básico no país.  Nele, um fato soa um tanto quanto curioso: constata que os resíduos de  agrotóxicos são a segunda principal fonte de contaminação das águas  brasileiras, atrás apenas do esgoto sanitário.
A análise  apresenta ainda que, com 6,24%, os agrotóxicos ficaram a frente dos  despejos industriais e da atividade mineradora como origens de  contaminação. O uso indiscriminado dessas substâncias acaba afetando  tanto a vida quanto a saúde da população.
A doutora Silvia  Brandalise, presidente do Centro Boldrini, especializado em câncer  infantil, localizado em Campinas e professora de Ciências Médicas da  Unicamp, diz que por ser um composto derivado de benzeno, o agrotóxico é  extremamente prejudicial à saúde, podendo disseminar o câncer. “O  agrotóxico, a maior parte deles, tem como matéria-prima básica os  derivados de benzeno. Os derivados de benzeno têm como ação importante a  quebra de cromátides, que são elementos que compõem o cromossoma. Uma  exposição aos derivados de benzeno ou à radiação, você consegue fazer  uma mutação. Sendo assim, o câncer e outras doenças, que são mutações  sucessivas, vão acontecendo na célula cronicamente exposta a esses  produtos”, explica.
A utilização dos agrotóxicos em larga escala  na agricultura chegou a tal ponto que é preciso parar com o despejo  desses produtos, segundo a coordenadora do Sistema Nacional de  Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox), Rosany Bochner. “A verdade é  que chegamos a um limite. Não tem mais como falarmos apenas em diminuir  ou usar outro tipo. É preciso acabar com o uso. Acreditamos que é  necessário até mudar a maneira de como o Brasil lida com a produção de  alimentos. Seria uma revolução maior”, afirma a coordenadora.
Outro  grande problema apontado por Rosany é a questão dos alimentos  geneticamente modificados, pelo fato de utilizarem “muito agrotóxico  para o seu cultivo, em especial a soja. Com isso, toda a soja carrega  uma quantidade enorme de produtos químicos na sua composição. Sem contar  que os produtores que não utilizam os transgênicos, mas possuem  agricultores vizinhos que os produzem, acabam por ter suas plantações  também contaminadas”, explica.
Ainda segundo a coordenadora, o  Brasil se habituou a utilizar a monocultura como forma predominante nas  plantações, o que força os agricultores a aplicar os agrotóxicos.
“O que é proposto por especialistas de produção é a agroecologia.  Entretanto, esse conceito iria mexer em uma questão cultural, já que  hoje você tem todo mundo comendo a mesma coisa o tempo todo. Não há mais  a produção de uma fruta, por exemplo, em determinada época do ano, e  sim, a produção dela o ano inteiro, por conta da manipulação”,  acrescenta Rosany.
Saúde
Chamados pela indústria de “defensivos agrícolas”, o uso de  pesticidas ainda podem provocar danos na medula, a ponto de um  transplante se fazer necessário. “O defensivo agrícola é um veneno para o  homem, pois ele altera o cromossomo da célula. Uma das ações que ele  faz no ser humano é diminuir a produção dos glóbulos brancos. Com a  queda de glóbulos brancos, a imunidade cai. Isso provoca uma aplasia de  medula, quer dizer, a medula óssea não produz mais os elementos do  sangue. Nesse cenário, que é uma destruição global da medula óssea, só o  transplante de medula pode resolver”, relata Brandalise.
Diversos  estudos já comprovaram que foi detectada uma quantidade significativa  de agrotóxicos em águas da chuva. Na Universidade Estadual de Campinas  (Unicamp), existem teses que já provaram que essas toxinas foram  encontradas no leite materno, o que prejudica na formação do bebê. Tanto  para médicos, quanto para especialistas, a fiscalização das leis que  regulamentam o uso dos agrotóxicos, e até a extinção deles, é essencial  para que a saúde da população seja a prioridade na hora de se produzir  um alimento.
Todavia, mesmo as legislações já vigentes que  regulam a utilização desses produtos são pouco respeitadas pelo setor.  “Existe legislação que proíbe a pulverização com veneno uma árvore que  já tem frutos, por exemplo. Mas na prática se vê aviões pulverizando pés  de banana, de laranja, etc., já com o fruto na árvore. Ou seja, a  quantidade de derivado de benzeno que vai ficar nessa fruta é enorme”,  salienta a doutora.
Além do fato de existirem diversos “produtos  que estão com a quantidade muito maior de agrotóxico do que seria  permitida pela Vigilância Sanitária. Nisso, os consumidores ingerem uma  hortaliça ou uma verdura com um altíssimo teor”, enfatiza.
Intimidação
No  entanto, apesar de já existirem diversos estudos que relacionam a  contaminação da água por venenos agrícolas, Rosany destaca a dificuldade  que há em associar causa e efeito nessa questão. 
“O Sinitox  registrava apenas intoxicações agudas. Contudo, com a contaminação da  água, pode-se levar uma população a desenvolver uma desintoxicação que  será crônica. O sistema de saúde não irá registrar essa intoxicação como  causada pelos agrotóxicos, pois ao longo do tempo é que irão aparecer  os problemas. Verificar esse nexo causal, provar que existe essa  relação, é muito difícil”, explica. 
“É nessa incerteza que as  indústrias se beneficiam, porque quando se vai fazer qualquer tipo de  denúncia, ela exige que tenha uma comprovação de nexo causal. Como ainda  não se tem essa relação, essas empresas acabam entrando na justiça  contra quem declarou qualquer coisa, intimidando as pessoas de fazerem  qualquer tipo de declaração. E por essa pressão, as pessoas acabam não  falando sobre o assunto”, conclui.
Por Leandro Carrasco
Da Página do MST
www.mst.org.br 
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