Reservas com dez ou mais árvores de pequi por ha geram margem bruta maior ou igual à obtida com produção de soja. Crédito: Ana Cláudia Sant´Anna
Há um conflito entre interesses públicos e privados em relação ao novo Código Florestal que está sendo votado no Senado. Um dos pontos polêmicos, o uso da reserva legal, foi foco de pesquisa desenvolvida na Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (USP/ESALQ) que analisou o uso sustentável dessas áreas. Como compatibilizar o benefício da conservação da Reserva Legal no Cerrado, que é recebido por toda a sociedade, e os custos do dono da terra que é obrigado a abrir mão de usar parte de sua propriedade? Assim, o estudo teve analisou se o uso extrativista e “sustentável” da Reserva Legal no Cerrado seria suficientemente para amenizar as perdas em custo de oportunidade da área.
O dissertação de Ana Cláudia Sant’Anna, desenvolvida no programa de pós-graduação (PPG) em Economia Aplicada, investigou o custo de oportunidade da RL e avaliou a viabilidade de geração de renda pelo uso do Cerrado em pé mediante o extrativismo do pequi. Como custo de oportunidade, considerou-se o cultivo da soja. “Um uso rentável da RL incentivaria o proprietário a mantê-la e, conseqüentemente, conservaria o Cerrado e reduziria a necessidade de fiscalização das RLs pelo governo”, declara a pesquisadora.
Com orientação de Ricardo Shirota, do Departamento de Economia, Administração e Sociologia (LES), a pesquisa comparou a margem bruta por hectare do extrativismo do pequi com aquela obtida pelo cultivo da soja e, se a primeira atividade seria atrativa o suficiente para o proprietário cumprir, por interesse próprio, o Código Florestal. A hipótese de que o extrativismo sustentável do pequi em RL constitui uma forma de amenizar as perdas do proprietário e de incentivá-lo à conservação do Cerrado em propriedade privada foi confirmada.
As áreas de estudo foram as microrregiões de Iporá (GO) e Pirapora (MG), pois as duas praticam o extrativismo do pequi e a produção de soja e ambas possuem características semelhantes aos locais com informações sobre os custos de produção para o extrativismo e para a soja, estimadas pela CONAB. Com base em dados dos CEASAs de Goiás, Uberlândia (MG) e Belo Horizonte (MG), junto com informações da CONAB e de estudos da EMBRAPA estimou-se, utilizando simulações de Monte Carlo, a distribuição de probabilidade da margem bruta do extrativismo do pequi por hectare. “Considerou-se como extrativismo sustentável a coleta de 36,3% dos frutos. A margem bruta do cultivo da soja foi estimada utilizando informações da CONAB. Já a margem bruta da extração sustentável do pequi por hectare, simulada pelo método de Monte Carlo, foi subtraída da margem bruta de um hectare de soja”, explica a pesquisadora.
Os principais resultados da pesquisa indicam que reservas legais com dez ou mais árvores de pequi por hectare, em Iporá e Pirapora, vendidos nos CEASAs de Minas Gerais, geram uma margem bruta maior ou igual àquela obtida com a produção da soja. Em Iporá, o extrativismo sustentável do pequi em RL não é viável quando o fruto é comercializado no CEASA-GO. O estudo ainda sinalizou que, em certos casos, o extrativismo do pequi gerou uma margem bruta superior à da soja.
Considerações finais
No entanto, a autora do trabalho ressalta que o intuito não é incentivar o plantio de pequis nas RL devido às dificuldades do cultivo da árvore causadas, por exemplo, pelos problemas da quebra de dormência e as baixas taxas de germinação. “Além disso, não é permitida a plantação homogênea na RL. Os resultados favoráveis devem, no entanto, ser vistos com cautela. Em áreas com poucos pequizeiros, a rentabilidade maior do proprietário depende de uma maior produção e da sua venda em CEASAs específicos, cujo preço médio supera R$ 1,00. No entanto, esses mercados – CEAMG e CEART – possuem uma oferta de pequi inferior a mil toneladas e se desconhece as conseqüências que um aumento volumoso na oferta de pequi provocará nos preços. Possivelmente, o preço desses mercados se nivelará ao praticado no CEASA-GO, cuja oferta de pequi supera mil toneladas e que comercializa o fruto a preços inferiores”, completa.
Texto de Alicia Nascimento Aguiar, da USP/ESALQ, publicada pelo EcoDebate, 16/08/2011
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