Dificilmente fecharíamos as inúmeras comunidades do Baixo Parnaíba maranhense nesse quadro em que se coaduna certo grau de intuição social com certo grau de idealismo romântico se este quadro inspirasse nostalgia por anos derrocados pela transigência com a miséria e com a bandalheira ética que garrotearam a vida pública e as vidas privadas da região sem dó e sem piedade. Desgostaria muitíssimo um quadro em que o primeiro plano apregoasse cerimônias, cerimoniais e regalias que rebatessem solenemente a realidade em que se encontra o observador.
O enleio de intuição social e idealismo romântico possibilita transpor, e, segundo Ernst Bloch, filósofo judeu-marxista, “Pensar significa transpor”, a realidade naquilo que ela mais incrimina e recrimina as comunidades carentes do Baixo Parnaíba maranhense que é lidar com as injustiças para com a pessoa ou para com a coletividade naquilo que acabou se tornando a razão de ser e de viver dessas comunidades : o desempenho familiar na obtenção de alimentos.
Sufragar a agricultura familiar em suas modestas plantações de mandioca, arroz, feijão, tomate, maxixe, quiabo e banana virou um desatino e discriminá-la valoriza qualquer um que anseie “a modernidade” em seus braços. As acepções do designativo agricultura familiar depreciaram tanto para a sociedade como para os governos que quem se proclama agricultor familiar terá pela frente queixas sobre o quanto a zona rural atrasa o progresso do Brasil.
As comunidades do Baixo Parnaíba maranhense estão saturadas de suas próprias queixas. Quem as leva a sério, a não ser as próprias comunidades e as organizações não-governamentais que atuam na região ? Quem as leva a sério, a não ser os bacurizeiros que elevam os anseios das comunidades a alturas inimagináveis ? O inverno banha o solo e inunda cada trecho de estrada nas chapadas – Cerrado é chão e é água -, os bacuris se descuidam e o solo os fisga – muitos – para que o seu cheiro e o seu gosto aticem os sentidos daqueles que fazem da sua coleta e do seu beneficiamento uma fonte de renda pelo ano inteiro.
Por mais que o Cerrado seja chão oito meses e água apenas quatro, a presença massiva de bacurizeiros, em todos os municípios do Baixo Parnaíba maranhense, e a altura que eles alcançam, comprovam a importância dessa espécie florestal para a captação de água das chuvas e para a manutenção da biodiversidade – os bacurizeiros, nas chapadas do Baixo Parnaíba maranhense, crescem bem mais que os da pré-amazônia – o bacurizeiro de sessenta galhos na reserva extrativista Chapada Limpa foi derrubado para virar carvão vegetal e isso deleitou os terceirizados da Cosima em dezembro de 2006, contudo ele deixou seus epígonos que reflorestarão os duzentos hectares desmatados com licença da Secretaria de Meio Ambiente.
Mayron Régis, 2008
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