Foram 5 horas de audiência. De um lado, representantes da Suzano fazendo
"seu comercial". Do outro, a população do Baixo Parnaíba, representada
por trabalhadores rurais, paróquias e outras entidades. Mediando o
encontro esteve a SEMA (Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos
Naturais), que convocou a audiência conforme determina a lei.
A reunião teve início por volta das 19h30, com a leitura de seu
'regulamento' seguida de uma breve apresentação do projeto da Suzano e
de um resumo do Estudo de Impacto Ambiental (e respectivo relatório) do
empreendimento.
Após um intervalo para o lanche, a audiência pública (propriamente dita) começou.
Perguntas escritas
Os questionamentos por escrito não suscitaram nenhuma surpresa.
Devidamente "filtrados" pela organização do evento, foram separados "por
grupo", lidos rapidamente e mecanicamente respondidos. Resumiram-se a
perguntas técnicas e sobre "como empregar-se na firma". Participantes
comentaram que algumas questões foram, convenientemente, esquecidas pela
Suzano.
Perguntas orais
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Pe. Manuel Neves |
O primeiro a usar da palavra foi
Manuel Neves,
representando a comunidade católica local. Segundo ele, a historinha
contada pela Suzano no "primeiro ato" da reunião foi até bonita, mas
destoa muito da realidade. O pároco relatou que conhece a cultura do
eucalipto, e suas trágicas consequências, desde quando residia em
Portugal. Na Europa, segundo ele, tais empreendimentos eram instalados
nas regiões mais pobres com a mesma falsa promessa: a de melhorar a vida
do povo necessitado. Portanto, não era de se estranhar que, no Brasil, a
monocultura viesse parar no Baixo Parnaíba, região mais carente do
Maranhão, estado mais pobre da Federação. Neves contestou muitas
informações prestadas pela Suzano.
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Marcos Stolf |
O principal porta-voz da empresa,
Marcos Stolf, iniciou sua resposta com uma frase que repetiria por inúmeras vezes naquela noite:
"Agradeço as colocações..."
e tentou rebater os argumentos do pároco alegando que trabalha há mais
de 30 anos com o eucalipto, sugerindo que teria mais conhecimento que
ele sobre o assunto. Neves, por sua vez, replicou que sua família
conhece a monocultura há 100 anos. Primeiro questionamento oral,
primeiro mico da Suzano.
A partir daí, tirando um ou dois "suspeitos" que elogiaram o projeto da Suzano, como o prefeito de São Benedito do Rio Preto,
José Creomar
(tinha que ser um político corrupto!), a empresa se viu em uma
verdadeira "sinuca de bico". Um a um seus argumentos foram derrubados
por representantes de entidades classistas e ambientais. Moradores de
comunidades dizimadas e/ou griladas pela empresa também se fizeram
ouvir.
Um idoso do povoado Formiga, sito no município de Anapurus, perguntou
por seus mourões, arame e telhas "apreendidos" pela empresa via ação
judicial "ilegítima", segundo a família do mesmo. O "assessor jurídico"
da Suzano, ao dizer que tais materiais se encontravam na sede da empresa
à disposição dos interessados, ouviu do povo que
"assim como eles
souberam tomar os bens de quem detinha a posse da terra há várias
gerações, eles também deveriam saber devolvê-los aos respectivos donos".
Por mais de uma vez, a Suzano foi acusada de falsificar documentos para
esbulhar terras alheias e não se defendeu a contento. Um sindicalista
zombou dos porta-vozes da empresa em razão de não saberem a diferença
entre as palavras "quilombo" e "quilombola", logo após terem falado
sobre o povoado Bom Sucesso, situado entre os municípios de Chapadinha e
Mata Roma. E a surra entrou pela madrugada, sob os aplausos do
público...
Governi$tas e péla-sacos
Pasmos diante da desaprovação do povo, os ge$tores de Chapadinha - deputado (não eleito)
Magno Bacelar e prefeita (idem)
Danúbia Carneiro
- abandonaram a audiência uma hora e meia antes de seu término, junto
com toda a sua comitiva. Isso mesmo, senhores: aqueles que deveriam
defender os interesses da população saíram no meio da "batalha" e
ordenaram a seus blogueiros péla-sacos que "amenizassem" a reação do
público ao empreendimento, tão útil em ano eleitoral...
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Governi$tas desolados com a desaprovação do público |
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Governi$tas saindo "de mansinho", 1 hora e 1/2 antes do término |
Escancarando sua servidão, um jornali$ta da prefeita noticiou que, segundo o estudo realizado,
"os impactos positivos superavam, em larga escala, os negativos", sendo que, na realidade, o estudo apontou
11 (
onze) impactos e riscos negativos e apenas
03 (
três)
impactos positivos - dentre os quais a utopia de que os impostos pagos
pela empresa retornarão à população em forma de benefícios.
Ele$ também tentaram minimizar a área afetada pelo negócio, publicando
uma imagem que destacava apenas a Fazenda Santo Ângelo, onde a fábrica
será instalada, como se a empresa fosse utilizar somente aquela área,
que já estaria, inclusive, desmatada. No entanto, o próprio Estudo de
Impacto Ambiental (EIA) mostra que a área afetada será muitíssimo maior e
possui ampla vegetação nativa:
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Área afetada, segundo o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) |
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Vegetação afetada, segundo o mesmo estudo |
Algumas falácias da Suzano
Em dado momento, Marcos Stolf disse ao público:
"Não se preocupem, a empresa vai gerar sua própria energia", insinuando uma suposta preocupação desta com o bem-estar da população... Logo depois, descreveu o processo:
"Até
7 metros, os troncos serão utilizados para fabricar pellets. Acima
disso, serão queimados para gerar energia para a empresa." Conclusão: Adeus céu risonho e límpido...
"O eucalipto absorve o gás carbônico da atmosfera", fizeram questão de esclarecer os técnicos, sem mencionar que, na escuridão da noite, ele "inspira" oxigênio e expele CO
2, como qualquer outra árvore... Ou será que eles irão manter a floresta iluminada durante toda a noite?
Por falar em "floresta", os técnicos da empresa pararam de chamar os
campos de eucalipto dessa forma assim que foram "corrigidos" por um
participante, durante as perguntas orais. Restou evidente que tentavam
evitar o termo nocivo "monocultura", substituindo-o por "floresta" -
ambiente diversificado e ecologicamente estável (muito diferente do
primeiro).
"As raízes do eucalipto tem, em média, 3 metros e não secam rios e veios, como dizem",
justificaram os representantes da Suzano. Após uma breve pesquisa na
internet, descobri que, para que atinja tal condição, a planta deve ser
clonada, plantada de modo correto e em solo previamente preparado,
ocasião em que, dependendo do clima, suas raízes cresceriam mais
horizontalmente e absorveriam apenas a água retida na superfície do
solo... O interessante é que, em nossa região, mais precisamente em
Urbano Santos, o cultivo da planta - pela mesma empresa - secou
nascentes e extinguiu riachos, como bem atestou a presidente do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais daquele município. Conclui-se, então,
que das duas uma: ou a tal técnica não funciona em nosso clima ou a
Suzano não toma as providências necessárias à proteção dos recursos
hídricos locais... Alguém arrisca um palpite?
Surra levada, lucro certo!
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Lucro certo - para a empresa! |
O fato de a Suzano ter "se saído péssima" na audiência
pública não significa que saiu perdendo: ela continua de vento em popa
com o projeto, uma vez que o evento foi apenas uma exigência legal para
informar a população sobre os riscos e vantagens do empreendimento mas
não pesará na decisão da SEMA sobre o licenciamento em análise. A
Suzano, por sinal, fez questão de dizer que já adquiriu algumas fazendas
locais, além de 12 mil hectares dos sojicultores. E continuará
adquirindo terras em nossa região, tamanha é a certeza de que nada
impedirá seu lucrativo projeto.
E por esta razão, o Pe. Manuel Neves e outros participantes propuseram uma outra audiência pública, conclamada
pelo povo e
para o povo,
para deliberar sobre a instalação da referida fábrica. O que fosse
decido poderia ser levado às autoridades competentes em forma de
abaixo-assinados e/ou Ações Civis Públicas.
A esta altura do campeonato, seria o único meio de barrar ou, pelo
menos, fiscalizar o referido empreendimento, haja vista que nossos
supostos representantes, no momento, só tem olhos para as eleições
vindouras. Fica a dica, ou melhor, o apelo...
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