São Raimundo das Mangabeiras
PROCESSO Nº 0000796-51.2014.8.10.0129 (7972014)
AÇÃO: PROCEDIMENTO DE CONHECIMENTO | PROCEDIMENTO COMUM
ADVOGADOS: MICHELE RODRIGUES COSTA (OAB 10563-MA), JOCIVALDO SILVA OLIVEIRA (OAB/MA - 6313)
REU: ALESSANDRO PINHEIRO SANTOS e ELIAS RAMOS PASSOSe LUIS GONZAGA RAMOS e MARIA DE LOURDES MESSIAS e MARIA EDILEUSA MESSIAS
ADVOGADOS: EMERSON CARVALHO CARDOSO (OAB/MA 9571), EDNA MATOS COSTA CARVALHO (OAB/MA 8904) e DIOGO DINIZ RIBEIRO CABRAL (OAB/MA 9355)
SENTENÇA Cuida-se de ação reivindicatória proposta por ANA ZEFINHA MARTINS DE QUEIROZ em litisconsórcio com RAIMUNDO QUEIROZ DIAScontra ALESSANDRO PINHEIRO SANTOS, ELIAS RAMOS PASSOS, LUÍS GONZAGA RAMOS, MARIA DE LOURDES MESSIAS e MARIA EDILEUSA MESSIAS, com o intuito de reivindicar, com base no exercício do direito de propriedade, a posse do imóvel nominado como"BARRA DA ONÇA", matrícula n. 285 do Livro 2, B, do Registro de Imóveis do Município de São Raimundo das Mangabeiras, MA. Conforme a inicial, os réus teriam invadido e feito plantações na área reivindicada sem autorização, promovendo derrubadas, construindo cercas e impedindo que outros rendeiros trabalhem na área causando transtornos e prejuízos. Pugnaram pela concessão de medida reintegratória liminar e antecipada, requerendo, no mérito, a confirmação da tutela. Juntaram documentos para comprovar o exercício da propriedade (fls. 12/85). A escritura pública do imóvel foi trazida ao processo (fl. 27). Em 03/12/2014 foi deferida a antecipação da tutela inaudita altera parte (fls. 87/88). Os réus foram citados (fl. 89v; 90/96). Na contestação, afirmam que exercem a posse da área há mais de vinte anos de forma mansa, pacífica e sem interrupção, correspondente à área de 186,00,00 ha (cento e oitenta e seis hectares), ao invés dos 03 ha (três hectares) relatados na inicial. Argumentam que em 14/09/2011 ajuizaram ação de usucapião do imóvel (processo n. 727-24.2011.8.10.0129) e ação de interdito proibitório também relacionada à referida área. Advogam que apesar de não possuírem título, exercem a posse justa e de boa-fé, pugnando pela improcedência da ação. Os réus agravaram a decisão antecipatória, mas não obtiveram êxito na reversão do entendimento (fls. 123/129). Em 15/04/2016 a magistrada que me antecedeu determinou o
cumprimento da decisão antecipatória (fl. 145). Em 06/05/2016 o Comandante do 4º Batalhão da Polícia Militar prestou informações sobre o cumprimento da ordem judicial, justificando o impedimento quanto ao imediato atendimento em virtude do disposto na Portaria n. 044/2008-GCG, do Decreto 31.048/2015 e da Lei Estadual n. 10.246/2015, informando ao final que ficará aguardando a devida autorização para o emprego de força policial nas execuções dos mandados judiciais de manutenção e reintegração de posse (fls. 153/154). Os réus arguiram posteriormente que o processo de usucapião, julgado em seu desfavor, padecia de nulidade, em virtude da ausência de citação de um dos confiantes (fls. 156/158). Os autores informaram o descumprimento da ordem judicial pelos réus, sustentando que continuaram a modificar a área reivindicada, pugnando pela renovação do decreto de reintegração, informando ainda o descumprimento pelo Delegado de Polícia, Comandante do Batalhão de Polícia Militar e o Secretário de Segurança Pública do Estado, que teriam sido cientificados da ordem. Novo despacho determinou a intimação dos réus para cumprimento da ordem de desocupação, sob pena de responsabilização pelo crime de desobediência (fl. 162). Desse último despacho foram intimados: o responsável pela delegacia de polícia (fls. 163/164); o comandante da 3ª CIA do 4º Batalhão da Polícia Militar (fls. 165/166); todos os requeridos (fls. 167/168). Em seguida a ré MARIA EDILEUSA MESSIAS suscitou nos autos vício consistente em ajuizamento de ação reivindicatória na pendência de ação possessória, o que seria legalmente vedado (fls. 173/177). Informou ainda o ajuizamento de ação rescisória (fls. 181/186). Foi expedido o mandado de reintegração de posse (fls. 188/189), não cumprido por ausência de suporte policial para acompanhar a diligência (fl. 193). Em 29/05/2017 foi negado o pleito de suspensão da liminar, determinando-se novamente o cumprimento da ordem, com intimação da Secretaria de Segurança Pública, Secretaria de Direitos Humanos e Participação Popular, Comissão Estadual de Prevenção à Violência no Campo e na Cidade, com o intuito de autorizar o emprego de força policial (fl. 195). A ré MARIA EDILEUSA MESSIAS peticionou novamente afirmando se tratar a demanda de litígio coletivo, pugnando pela designação de audiência para ouvir as partes envolvidas, na forma do art. 565 do CPC (fls. 200/204). A Secretaria de Estado de Direitos Humanos e Participação Popular enviou relatório de situação, sugerindo a atuação da Comissão Estadual de Prevenção à Violência no Campo e outras providências (fls. 207/209; 232/233). O Ministério Público Estadual pugnou pelo ingresso no feito, por entender que se trata de litígio coletivo de posse de terra rural (fl. 235). Por fim, em 20/11/2017 os autores vieram comunicar a ciência dos órgãos acerca da obrigatoriedade do cumprimento da decisão liminar, todavia ainda não a teriam cumprido, pugnando pela tomada de providências. É o relatório. DECIDO. Dou-me por satisfeito com as provas até agora produzidas. Com fundamento no art. 355 do Código de Processo Civil passo ao julgamento da causa. Preliminarmente, registro que o andamento do presente processo não se prejudica pelo ajuizamento de ação rescisória com o objetivo de reverter decisão desfavorável aos réus em ação de usucapião. Não está presente nenhuma das hipóteses do art. 313 do Código de Processo de Civil, tanto que os réus não apontaram a incidência de qualquer delas. Supero, portanto, a alegação de que haveria relação de prejudicialidade do presente processo em relação a qualquer outro. Por outro lado, ainda acerca das questões preliminares, houve um equívoco da parte ré e intervenientes, data maxima venia, consistente na errônea interpretação de que o caso discutido nestes autos se trataria de litígio coletivo, a exigir a incidência do art. 565 do Código de Processo Civil. Contrariamente ao que foi proposto, não trata a presente demanda de litígio coletivo, a envolver multiplicidade de pessoas com idênticos direitos inerentes à mesma área objeto da controvérsia. Trata-se, de modo diverso, de ação em que os proprietários buscam a retirada de sua área das cinco pessoas integrantes do polo passivo, sujeitos noticiadamente do mesmo grupo familiar, sem qualquer indicativo de que estejam sendo discutidos, nestes autos, tema de direitos difusos ou individuais homogêneos pertencentes a grande grupo de pessoas. Portanto, nada tem que se discutir no presente processo a respeito de direito coletivo, razão por que afasto o encaminhamento proposto, face à não incidência do art. 565, CPC. Por último - e ainda atinente às questões preliminares, razão assistiria aos réus quanto à incidência do art. 557 do Código de Processo Civil, na medida em que a presente ação teria sido proposta na pendência de ação possessória. Contudo, houve preclusão temporal relativamente à arguição (art. 337, CPC)- já que a contestação silencia a respeito da matéria, não se tratando de vício de natureza insanável sobre o qual o processo deveria ser anulado, tanto mais quando se observa na referida ação possessória (741-37.2013.8.10.0129) o insucesso dos réus relativamente ao direito pleiteado - tendo em conta sua sucumbência na ação principal de usucapião, com sentença transitada em julgado nesta e sentença reconhecendo a prejudicialidade daquela. Portanto, com fundamento na diretriz da prevalência da decisão de mérito (art. 6º, CPC), supero também a referida preliminar. No mérito, delimita-se a controvérsia em torno da definição do direito dos autores de reivindicar a posse do imóvel descrito na inicial, cuja causa de pedir próxima está lastreada no exercício do direito de propriedade. Com relação às provas, a certidão de inteiro teor do imóvel reivindicado deixa clara a propriedade do bem à titularidade dos autores (fl. 27). A esse propósito, aliás, registre-se que, além da certidão, milita no processo a incontrovérsia sobre o fato, uma vez que os réus não contrariam na contestação a certeza da propriedade (art. 374, inciso III, CPC). Sobre os argumentos da contestação, lastreia-se a exceção sob a alegação de que os réus exercem a posse há mais de 20 (vinte) anos. Não me passa despercebido ser lícito aos réus arguirem como matéria de defesa a ocorrência de usucapião (STF, Súmula, n. 237)- se é que foi esse o intento de sustentar o tempo de vinte anos de posse, já que isso não foi expressamente declarado na resposta à inicial. Todavia, não só os réus deixaram de fazer prova dessa longeva posse (art. 373, inciso II, do CPC), como já existe sentença judicial transitada em julgado não reconhecendo o direito usucapiendo (fls. 157/163, autos n. 727-24.2011.8.10.0129), imperando sobre esse fato a soberania da coisa julgada material (art. 5º, inciso XXXVII, Constituição). Portanto, nenhuma dúvida há que se levantar acerca da propriedade dos autores sobre a área reivindicada e tampouco sobre a já definida inexistência de direito de posse dos réus a se relacionar com aludido imóvel, seja pela prova produzida neste processo (art. 373, inciso I, do CPC), seja em virtude do trânsito em julgado da sentença que não reconheceu a usucapião (art. 5º, inciso XXXVII, Constituição). A propriedade é direito inviolável assegurado na Constituição: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: É papel do Poder Judiciário assegurar, garantir a observância sobretudo dos direitos constitucionais, notadamente aqueles tidos como fundamentais, tal qual o direito à propriedade. O art. 1.228 do Código Civil assegura ao proprietário o direito de reaver a coisa do poder de quem quer que injustamente lha possua ou detenha: Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. Esse direito não tem sido assegurado aos autores no curso deste processo. Explico: a decisão liminar data de
03/12/2014, foi reiterada para cumprimento por três vezes (fls. 145, 162 e 195). De lá já se vão mais de três anos sem que se cumpra uma ordem emanada do Poder Judiciário. O poder executivo teve ciência dessa determinação ao menos duas vezes, a saber, fls. 153/154 e 232/233. No entanto, não a cumpriu nem proporcionou meios ao cumprimento. De antemão, já afasto qualquer justificativa baseada na Lei n. 10.246/2015 no sentido de que estaria ela subordinando a decisão judicial à avaliação dos órgãos nela referidos, porque entendo inconstitucional essa interpretação. Consultei o texto da lei e não encontrei dispositivo semelhante a esse encaminhamento. Nem poderia ser diferente, porquanto em se tratando de legislação estadual está sujeita à previsão do art. 139, VII, do Código de Processo Civil, que confere ao magistrado o exercício do poder de polícia e a faculdade de requisitar, quando necessário, força policial; dispoção também prevista no artigo 536, § 1º, do Código de Processo Civil, recaindo no caso a expressa delimitação de matérias de acordo com a simetria Constitucional (art. 22, inciso I, da Constituição). Nem é necessária observação quanto à aplicação desse mesmo raciocínio, porque hierarquicamente inferiores, à Portaria n. 044/2008-GCG e ao Decreto n. 31.048/2015. Portanto, à luz da legislação vigente, no cumprimento das ordens judiciais neste e em qualquer outro processo não está o Poder Judiciário subordinado à avaliação de conveniência e oportunidade do atendimento, pelo Poder Executivo, do comando soberano da decisão. Relembre-se que o descumprimento de ordens do Poder Judiciário é situação apta a ensejar, inclusive, intervenção Federal no Estado, à luz do art. 34, incisos IV e VI da Constituição#. A decisão que antecipou os efeitos da tutela, portanto, deve ser imediatamente cumprida quando determinada, assim como deverá ser enviada cópia dos autos ao Ministério Público para avaliar eventual cometimento de crime de desobediência das ordens anteriormente expedidas nos presentes autos (art. 40, Código de Processo Penal). A propósito da antecipação dos efeitos da tutela, à avaliação preliminar de abertura do processo agrego a presente fundamentação em caráter de cognição exauriente, no sentido da efetiva comprovação do direito e, mais do que antes, no perigo de espera do trânsito em julgado, porquanto os autores estão há mais de três anos sem usufruir do espaço reivindicado, sem dele dispor para a produção agrícola desenvolvida na área (art. 300, CPC). À vista do exposto, com fundamento no art. 1.228 do Código Civil, ACOLHO o pedido dos autores para DETERMINAR a ALESSANDRO PINHEIRO DOS SANTOS, ELIAS RAMOS PASSOS, LUÍS GONZAGA RAMOS, MARIA DE LOURDES MESSIAS e MARIA EDILEUSA MESSIAS que desocupem, no prazo de 48 (quarenta e oito horas), o imóvel denominado "BARRA DA ONÇA", matrícula n. 285 do Livro 2, B, do Registro de Imóveis do Município de São Raimundo das Mangabeiras, MA. Com fundamento no art. 300 do Código de Processo Civil DEFIRO NOVAMENTE TUTELA DE URGÊNCIA em favor de ANA ZEFINHA MARTINS QUEIROZ e RAIMUNDO QUEIROZ DIAS para DETERMINAR a ALESSANDRO PINHEIRO DOS SANTOS, ELIAS RAMOS PASSOS, LUÍS GONZAGA RAMOS, MARIA DE LOURDES MESSIAS e MARIA EDILEUSA MESSIASque desocupem, no prazo de 48 (quarenta e oito horas) contados a partir da intimação desta sentença, o imóvel denominado "BARRA DA ONÇA", matrícula n. 285 do Livro 2, B, do Registro de Imóveis do Município de São Raimundo das Mangabeiras, MA, ficando advertidos de que o descumprimento da presente ordem, no prazo determinado, resultará na REMOÇÃO COMPULSÓRIA E IMEDIATA, com a utilização de força policial (art. 536, § 1º, CPC). Em caso de descumprimento da ordem de desocupação pelos réus, com fundamento no art. 536, § 1º, do CPC, REQUISITO desde já o auxílio policial para a efetivação da ordem de imissão a ser expedida e DETERMINO sejam intimados pessoalmente o diligente Senhor Secretário de Segurança Pública do Estado do Maranhão, o eminente Comandante da Polícia Militar do Estado do Maranhão, o responsável pelo Batalhão da Polícia Militar na Comarca de São Raimundo das Mangabeiras, MA, e o insigne Delegado de Polícia Civil responsável pela unidade da Comarca de São Raimundo das Mangabeiras, MA, para que cumpram, in continenti, a ordem de requisição da força policial. Com fundamento no art. 536, § 1º, e 573, ambos do CPC, APLICO MULTA de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) àquele que deixar de cumprir a ordem de requisição, sem prejuízo da responsabilização penal. E para que não se alegue desconhecimento, determino suas imediatas intimações do teor da presente sentença. Com fundamento no art. 536, § 3º, do CPC, CONDENO os réus ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) pela litigância de má-fé face ao descumprimento da ordem anterior (art. 81, c/c § 2º, CPC). Com fundamento no art. 40, CPP, DETERMINO o envio de cópia dos autos ao Ministério Público para apurar ocorrência do crime de desobediência e eventuais responsáveis por essa conduta. CONDENO os réus ao pagamento das custas e honorários. Quanto aos honorários, arbitro-os em 15% (quinze por cento) do valor da causa. Defiro o benefício da gratuidade da justiça (art. 98, § 3º, CPC), observando-se que, quanto à gratuidade, ela não alcança o dever de pagar as multas processuais (art. 98, § 4º, CPC). Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, observando-se a baixa na distribuição, as comunicações, cumprimentos e anotações necessárias. Publique-se. Registre-se. Intimem-se, inclusive o Ministério Público. São Raimundo das Mangabeiras, MA, aos 08 de fevereiro de 2018. Juiz HANIEL SÓSTENIS Titular da Comarca de São Raimundo das Mangabeiras - MA Resp: 188938
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