terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Monitorando a bacia do rio Munim, Baixo Parnaíba maranhense

Na inesperada passagem dos “gaúchos” pelo Baixo Parnaíba maranhense, a austeridade notável dos seus moradores foi e está sendo posta à prova por documentos frios, pelos imensos plantios de soja, pelas áreas experimentais de eucalipto, pelas carvoarias que queimam a mata nativa dos Cerrados, pelo uso intensivo de agrotóxicos e pela captação ilegal de água dos igarapés da bacia do rio Munim, como se as regras de convivência entre os grupos sociais, entre as atividades econômicas e entre o ser humano e a natureza fossem reescritas em uma linguagem permeada por termos altamente técnicos, legais e financeiros.

Rio Preto em Mata Roma/MA(Foto: Fórum Carajás)

Contudo, por mais auto-suficiente que seja, essa linguagem só se mostra exitosa à custa da corrosão e da esclerose de demais linguagens que se instalaram por séculos naqueles biomas – Cerrado, Caatinga e Mata dos Cocais -, naqueles rios – Munim, Preto, Buriti, Preguiça e Parnaíba -, naquelas espécies vegetais – bacuri, pequi e palmeira de babaçu – e nauqelas comunidades quilombolas e agro-extrativistas – Taboquinha, Lagoinha, Cajueiro I e II, Bom Sucesso, Guadalupe, Saco das Almas, Árvores Verdes, São João dos Pilões, Chapada Limpa, Mombaça e Mamorana – do Baixo Parnaíba maranhense.

A austeridade notável dos moradores se confunde com a placidez e a dependência com relação aos poderes públicos e aos políticos do Baixo Parnaíba em momentos de sufoco, como um animal mimético faria na ânsia de sobreviver ao seu predador, pois a austeridade que cada um evidencia no trato com membros de seu grupo social ou de sua comunidade esfumaça os males maiores que atingem as populações tradicionais do Baixo Parnaíba: pobreza, corrupção, assistencialismo e degradação ambiental.

As regras de convivência entre a agropecuária tradicional e a agricultura familiar tonificaram o projeto sojicultor, no final da década de 90, como alternativa econômica e social capaz de inundar o Baixo Parnaíba com riquezas variadas – em recente reunião, na cidade de Anapurus, um representante do Banco da Amazônia, e a propósito, também representante do agronegócio rasgava a seda para o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Anapurus em razão da série de “parcerias” promovidas entre o sindicato e o setor patronal e concluiu seu paparicos com a notícia desagradável que, mesmo após todo o desmatamento e toda a soja transportada das fazendas até o porto de Itaqui, o Índice de Desenvolvimento Humano para o município é o pior de todo o Baixo Parnaíba – Anapurus que renegou o Cerrado em prol de artificialidades como uma clinica estética -, porque na visão de muitos, ou seriam muito poucos?, as áreas de chapadas e suas extremas florestas de Bacuri e de Pequi imobilizaram o desenvolvimento da região em práticas seculares de roça de toco e de extrativismo vegetal e animal.

Quase uma década – quem se abala com os desmatamentos de Bacuri e de Pequi em Anapurus e Mata Roma e com a pressão pela abertura de novas áreas por parte das fazendas de soja e da Margusa, subsidiária do grupo Gerdau? A fazenda Europa, município de Mata Roma, bacia do Rio Munim, arrendou seus quase três mil hectares para que uma empresa terceirizada da Margusa desmate e transforme a madeira em carvão vegetal. Calejada pelas dificuldades em aprovar seu projeto de reflorestamento com eucalipto, a Margusa caça áreas de mata nativa em todo o Baixo Parnaíba, em Grajaú, em Caxias, estado do maranhão, e Regeneração, estado do Piauí.

Fazenda Europa – Ao todo setenta fornos expeliam fumaça para um céu de chuva fina enquanto quarenta trabalhadores impregnavam seus juízos com a zoada de motos-serras e sujavam seus aspectos de homens jovens ou homens velhos de Mata Roma, Urbano Santos, Santa Quitéria e Coelho Neto produzindo carvão vegetal. Dava na mesma para eles se um grupo da pastoral da juventude de Mata Roma e jovens da Taboquinha, comunidade próxima do desmatamento e dos fornos, rezassem pelas árvores abatidas. Os vinte e cinco reais por dia – seis dias por semana – o domingo para descanso – regariam o trabalho até março de 2008, como a água captada do riacho Taboquinha esfriaria o carvão recém-saído dos fornos; a empresa paga direitinho os direitos dos trabalhadores, mas captando 12 mil litros de água do Taboquinha, sem licença ambiental, quem paga a conta do meio ambiente e da comunidade que ficará sem água?

Segundo informações da vereadora Enilda, coordenadora da Aprema (Associação de Proteção ao Riacho Estrela e Meio Ambiente), a fazenda Europa resultou das grilagens de terras praticadas por políticos de Mata Roma que as venderam para a sra. Claudia, que planta soja com financiamento do Banco da Amazônia. A vereadora precisa bem os anos, nos quais, a sua família e as outras de Mata Roma precisadas de fontes de vitaminas se mandavam para as chapadas e coletavam Pequi e Bacuri. Embutidos na memória do senhor Manoel, poeta da comunidade de Taboquinha, dezenas de bacuri continuam forrando dezenas de sacos de estopa e se avolumando em um canto de sua morada.

Por: Mayron Régis
julho 2007
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