sexta-feira, 3 de julho de 2020

Papeis velhos

Pouco se saia de casa. O dia se perpetuava em poucos espaços e em poucas aberturas para deslocamento. As pessoas se deslocavam para o trabalho e para a escola no centro da cidade e retornavam para almoçar. Novamente saiam em direção ao centro com objetivos escolares e objetivos trabalhistas. A vida no bairro se comprazia nos comércios de esquina em que se comprava uma manteiga que se enrolava e pães que se enrolavam em papéis velhos para o café da manhã e nas feiras onde se comprava um litro de juçara e um quilo de farinha seca para a sobremesa do almoço. O comercio aglomerava compradores de bens de consumo não duráveis e espectadores do espetáculo cotidiano que davam um tempo no local para procurar o que fazer em outro canto. A feira dispensava aglomeração dentro e fora dela. Comprava-se rápido e com pouca exigência. Não podia ser diferente. Quem trabalhava como feirante naquelas condições sanitárias não queria estar lá. Ganhava-se pouco, uma miséria para falar a verdade. Tirando um outro privilegiado, a maioria da população ganhava o insuficiente para sobreviver. Quem trabalhava na feira, trabalhava não porque queria, mas sim porque nesse espaço se podia atender as exigências da sociedade que eram poucas para esse tipo de trabalho. As pessoas não queriam saber de brincadeiras. Eram espaços muito adultos, o comercio, a rua e a casa. A noite se vislumbrava uma abertura e um afrouxamento na vigilância. As crianças brincavam juntas porque praticamente passavam o dia sozinhas em seus afazeres domésticos e em seus afazeres escolares. A rua à noite era o espaço de aglomeração e de perdição de poucas horas. Coisa que não se permitia no restante do dia.

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