terça-feira, 9 de julho de 2013

Plantações de eucalipto para energia: O caso da Suzano no Baixo Parnaíba, Maranhão, Brasil Primeira Parte



Ivonete Gonçalves de Souza (CEPEDES)
Winfridus Overbeek (WRM)

Enquanto estão comprando o produto, estão deixando desgraça para nós” (resposta de liderança comunitária em Santa Quitéria, Baixo Parnaíba, Maranhão, à pergunta sobre qual seria sua mensagem aos compradores europeus da madeira da Suzano)
Em tempos em que as economias mais “cinzentas” do mundo são rebatizadas de “verdes” e formas depredadoras de geração de energia, chamadas de “renováveis”, é de suma importância mostrar o que há por trás dessas palavras, ou seja, conhecer melhor a realidade dos projetos “renováveis” e “verdes”.
Um exemplo é o projeto desenvolvido pela empresa brasileira Suzano Papel e Celulose na região do Baixo Parnaíba, estado do Maranhão, justificado como “inovador”[1]. Trata-se de produzir uma energia “renovável” através de biomassa de madeira, os chamados “pellets”, ou seja, pequenos pedaços adensados de madeira, produzidos a partir de extensas monoculturas de árvores de eucalipto, chamadas de “florestas plantadas” ou “florestas energéticas”.  O objetivo é vender os “pellets” a empresas de energia na Europa, que precisam cumprir as novas metas obrigatórias da União Europeia de utilização de “energias renováveis”, tendo como suposto “objetivo” proteger melhor o clima. Um porta-voz da empresa de energia britânica MGT Power Ltda, que busca substituir o uso de combustíveis fósseis e também uma possível compradora de “pellets” da Suzano, afirmou que fazer negócios com essa empresa é confortável, uma vez que se trata de uma das maiores produtoras de papel e celulose do mundo, além de ser bem estabelecida e ter credenciais de sustentabilidade[2]. Mas de qual “sustentabilidade” a empresa britânica está falando?
O objetivo deste artigo é mostrar o que ocorre na região do Baixo Parnaíba, onde a Suzano está promovendo a monocultura de eucalipto para fins de energia.  O Cerrado, com sua exuberância e sua diversidade, é fonte de sobrevivência de muitas famílias e vem sendo destruído com o uso de tratores e correntões. Ao destruir o Cerrado, a Suzano destrói também as formas de vida dessas comunidades, que estão indignadas. Uma liderança de 51 anos, de uma comunidade com 100 famílias que não têm e não conhecem outro lugar para viver, desabafa: 
“A Suzano está destruindo a nossa fonte de renda. Vivemos basicamente do bacuri  e aqui tiramos pelo menos 100 toneladas por vez. E é disso que a gente vive. Além do bacuri, dentro desta área tem paca, tatu, veado, jacu, nambu. Além de pássaros e outras espécies também importantes pra nós. Na chapada tem remédio, tem fruta, tem flores, tem beleza e dá pra soltar um pouco de gado por lá.”
Dedicamos este artigo a todas as comunidades[3], suas mulheres e homens, que têm resistido bravamente às tentativas da Suzano de se apropriar dos seus territórios e destruir extensas chapadas cobertas de Cerrado.
Breve histórico das comunidades tradicionais do Baixo Parnaíba
A grande maioria das terras na região do Baixo Parnaíba[4] e no estado de Maranhão é devoluta, ou seja, terras que nunca foram devidamente registradas nas instâncias oficiais do Estado e que, por isso, pertencem legalmente ao estado do Maranhão, cujo dever é regularizá-las em favor daqueles que as ocupam, conforme determina a Constituição Brasileira de 1988.
Terra devoluta não é sinônimo de terra desabitada, ao contrário. No Baixo Parnaíba, assim como em todo o território brasileiro, as terras devolutas costumam ser habitadas e usadas de forma secular por comunidades locais que delas sobrevivem, praticando uma agricultura de pequena escala e diversificada de arroz, feijão, milho e mandioca, fazendo hortas e criando pequenos animais[5]. Essas comunidades fazem uso do bioma predominante na região, neste caso, o Cerrado, vivendo nas áreas mais baixas, permeadas por riachos e rios, repletos de imponentes buritizeiros  – palmeiras muito utilizadas pelas comunidades para alimentação. Mas a maior parte do Cerrado ocupa as vastas áreas de chapada, formando uma terra, mais alta e plana, de uso comum e aberto para todos, oferecendo alimentos como as frutas do bacurizeiro e do pequizeiro, muito apreciadas pelos moradores; materiais para a construção de casas e confecção de utensílios como esteiras e peneiras, lenha para cozinhar, diversas matérias-primas para remédios naturais e muito mais. O modo de vida, bem como a valorização do uso coletivo de grande parte do território, além da convivência harmoniosa com o ecossistema local, faz com que as comunidades no Baixo Parnaíba, também chamado de Leste Maranhense, possam ser definidas como comunidades tradicionais.
As famílias que foram compondo as comunidades do Baixo Parnaíba eram, na sua grande maioria, posseiras, populações agroextrativistas sem título das terras onde se instalaram, mas que construíram seu modo de vida fortemente ligado ao lugar, ao território e ao Cerrado e seus muitos benefícios e utilidades. A maior parte das famílias chegou no Século XIX, vinda dos estados próximos do Piauí e do Ceará, de onde partiu fugindo da seca, e se estabeleceu nas terras do Baixo Parnaíba. E já se foram muitas gerações, portanto, as terras foram se configurando como tradicionalmente ocupadas por essas comunidades camponesas[6], que também incluem 14 comunidades quilombolas[7] estabelecidas na região, visto que, no século XIX, a região também estava na rota de fuga de negros escravizados. 
O fato que mais incentivou o processo de negociar e vender as terras das comunidades tradicionais nas últimas décadas, no Maranhão, foi a promulgação da Lei Estadual das Terras no. 2.979 de 1969 pelo governo do estado. Essa Lei ocasionou uma série de conflitos entre grandes proprietários de terras e comunidades de posseiros – conflitos sobre posse e acesso a terras, que levaram, inclusive, à expulsão de muitas famílias e comunidades[8].
Histórico do projeto da monocultura do eucalipto no Baixo Parnaíba
Na década de 1980, a Maranhão Gusa S/A (MARGUSA) chegou na região com um projeto de produção de carvão vegetal, motivado pela abertura da mina de ferro de Carajás, da VALE, no vizinho estado do Pará. A mina de Carajás levou à criação de dezenas de siderúrgicas de ferro gusa, aumentando a demanda por carvão vegetal como fonte energética. A MARGUSA não comprava terras; em vez disso, pagava pessoas para cortar madeira do Cerrado nas chapadas, causando muita devastação. No entanto, criou uma empresa “florestal”, a Maranhão Forestal S/A (MARFLORA), com o objetivo de plantar eucalipto, como também fez a ITAPAGÉ Papéis, Celulose e Artefatos, pertencente ao Grupo Industrial João Santos, de Pernambuco.
A Suzano também chegou à região nos anos 1980, sob o nome de Comercial e Agrícola Paineiras S/A, adquirindo áreas de eucalipto da MARGUSA quando esta começou a entrar em crise financeira. Paralelamente, a própria Paineiras arrendou novamente áreas para a MARGUSA quando esta tentou retomar o plantio de eucalipto em 2003, ano em que foi comprada pela GERDAU[9]. Porém, o projeto de plantio de eucalipto da MARGUSA nos anos seguintes nunca se concretizou, visto que o EIA/RIMA elaborado por uma empresa chamada STCP[10] para o plantio de 100 mil hectares de eucalipto no Maranhão nunca foi concluído, e a GERDAU acabou se retirando da empresa no final de 2007.
À partir de 2008, foi a vez de a Suzano expandir fortemente o plantio de eucalipto no Baixo Parnaíba, em terras das quais a Paineiras já tinha se apropriado anteriormente. A Suzano  também adquiriu mais terras por conta própria, com a ideia de produzir madeira para um projeto de celulose no vizinho estado do Piauí. Ali, a Suzano pretendia plantar 160.000 hectares de eucalipto, enquanto, no Maranhão, a idéia era plantar 400 mil hectares no estado todo, visando abastecer também um segundo projeto de uma fábrica de celulose em Imperatriz, no Sul do estado.[11]
O processo de expansão do eucalipto na região do Baixo Parnaíba ocasionou, a partir de 2005, uma explosão de conflitos com as comunidades que começaram a perder suas áreas de chapada, exatamente as terras planas e agricultáveis que estão na mira da Suzano.
A partir de 2008-2009, o projeto da fábrica de celulose no Piauí[12] deu indícios de inviabilidade, pelo menos no curto prazo. Diante disso, a Suzano muda o destino das plantações de eucalipto no Baixo Parnaíba para a produção de pellets para exportação, de olho no novo mercado emergente na Europa, que demanda biomassa de madeira como fonte energética alternativa a petróleo e carvão mineral. Em 2009, no apagar das luzes do governo estadual do ex-governador Jackson Lago, a Suzano conseguiu obter a licença ambiental – de instalação e operação – para seu projeto de plantio de eucalipto na região, recebendo autorização para o desmatamento de cerca de 40 mil hectares de Cerrado para plantar uma área correspondente de monocultura de eucaliptos nos municípios de Santa Quitéria, Urbano Santos e Anapurus[13]. O Fórum Carajás[14] estima que hoje existam cerca de 30 a 40 mil hectares de eucaliptos plantados no Baixo Parnaíba, concentrados nos municípios mencionados, afetando diretamente a vida de mais de 50 comunidades rurais tradicionais.
Um dos principais motivos que trouxeram a Suzano, que pertence a uma família tradicional do estado de São Paulo, no Sudeste, para se expandir longe dali, no Nordeste, foi e continua sendo o atrativo baixo preço de terra. Trata-se de um mesmo padrão de migração rumo ao Norte e Nordeste do país, já traçado por outras monoculturas do agronegócio brasileiro, como cana e soja. Moradores das comunidades no Baixo Parnaíba falam em preços de terras pagos no ano 2000 em torno de R$ 80 por hectare, sendo que o valor hoje estaria chegando a 500 reais, ainda muito baixo em comparação com o preço médio pago pela terra no Brasil e extremamente baixo se comparado ao preço praticado hoje nos estados do Sudeste, onde há a maior concentração da monocultura de eucalipto. O preço médio das terras no Brasil para agricultura, pecuária e “reflorestamento” ­– leia-se: monocultura de eucalipto – saltou de R$ 2.280 por hectare em 2003 para R$ 7.470 em 2012, sendo que o preço por hectare de terra no estado de São Paulo em 2012 chegou a valores de R$ 32.000[15].
Outro grande projeto no Baixo Parnaíba veio com a chegada de plantadores de soja do Rio Grande do Sul, os chamados “gaúchos”, no final dos anos 90, o que também deu início à destruição do Cerrado e à concentração de terras. Os gaúchos projetavam plantar 500 mil hectares de soja na região. Não conseguiram concretizar esse plano, mas, mesmo assim, destruíram quase 40 mil hectares de Cerrado, hoje transformados em monocultura de soja.


[1] http://www.relatoriosuzano2011.com.br/PDFs/RA_Suzano2011.pdf
[2] http://biomassmagazine.com/articles/5023/mgt-signs-mou-with-suzano-for-biomass-supply
[3] Diversas comunidades impactadas pela ação da Suzano receberam visita de campo por parte dos autores no período de 13 a 17 de maio de 2013; ressaltamos que não citamos nomes das pessoas que nos acolheram e nos concederam entrevistas durante nossa estadia na região, buscando resguardá-las, devido ao clima tenso em torno dos conflitos de terra na região.
[4] Território com 19.179 km2 e 16 municípios, com uma população de 411 mil habitantes, sendo que 53% do total vivem na área rural (http://www.territoriosdacidadania.gov.br/dotlrn/clubs/territriosrurais/baixoparnabama/one-community?page_num=0) , muito mais do que a média nacional da população rural de cerca de 15%.
[5] No Brasil, cerca de 70% dos alimentos que compõem a alimentação básica dos brasileiros são produzidos pela pequena agricultura familiar e camponesa.
[6] Gaspar, Rafael, “Mobilização e Justiça Ambiental: resistência camponesa e as transformações agrárias no Médio Mearim e Leste Maranhense”, http://www.abant.org.br/conteudo/ANAIS/CD_Virtual_26_RBA/grupos_de_trabalho/trabalhos/GT%2036/rafael%20bezerra%20gaspar.pdf
[7] http://www.territoriosdacidadania.gov.br/dotlrn/clubs/territriosrurais/baixoparnabama/one-community?page_num=0
[8] Gaspar, Rafael, “Mobilização e Justiça Ambiental: resistência camponesa e as transformações agrárias no Médio Mearim e Leste Maranhense”, http://www.abant.org.br/conteudo/ANAIS/CD_Virtual_26_RBA/grupos_de_trabalho/trabalhos/GT%2036/rafael%20bezerra%20gaspar.pdf
[9] http://www.abmbrasil.com.br/news/noticia_integra.asp?cd=573
[10] Régis, Mayron, 2011. “As chapadas e os bacuris”, Fórum Carajás, página 55 – vale complementar que esta empresa de consultoria, a STCP, também foi posteriormente contratada pela Suzano para elaboração de EIA/RIMA.
[11] Régis, Mayron, “As chapadas e os bacuris”, 2011.  Fórum Carajás, página 50.
[12] Diversos artigos na imprensa afirmam que o projeto não será retomado antes de 2016.
[13] Régis, Mayron, “As chapadas e os bacuris”, 2011, Fórum Carajás, página 60.
[14] Organização não governamental criada no início dos anos 90 para monitorar a expansão e os impactos dos grandes projetos desenvolvimentistas no estado de Maranhão.
[15] http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,preco-da-terra-agricola-subiu-227-em-dez-anos-quase-o-dobro-da-inflacao-,1003989,0.htm

2 comentários:

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  2. Eu acho legal o autor da matéria falar em comunidades que "perderam" suas terras...

    PERDERAM OU VENDERAM...????

    E porque o preço das terras é tão baixo...???
    Se essas são terras tão boas, porque vendem...???

    É muita pilantragem ideológica pra o meu gosto...

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