segunda-feira, 15 de abril de 2013

Carta Comunidades Quilombolas do Charco

 
Quilombolas do Charco e de Juçaral, em São Vicente Ferrer (MA) divulgaram nessa segunda-feira, 15 de abril, denunciando que sofrerão uma inspeção judicial a pedido de um pretenso proprietário de parte do território quilombola dessas comunidades. Confira o documento:
 
 
Estamos em campo a tratar da nossa Libertação!
 
Aos companheiros e companheiras da Caminhada
 
Nós, quilombolas de Charco e Juçaral, localizados no município de São Vicente Ferrer (MA), vivemos dias de muita apreensão. No dia 24 de abril, será realizada uma inspeção judicial determinada pela Justiça Federal do Maranhão atendendo solicitação do pretenso proprietário de parte do nosso território. Segundo ele, descumprimos um acordo judicial que pretendeu confinar 96 famílias numa área de 101ha – área total das nossas roças, nossos caminhos e nossas moradias - desde fevereiro de 2011.
 
Essa situação, não podemos deixar de reconhecer, foi agravada pela morosidade do INCRA em concluir o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) do nosso território, atendendo à política etnocida imposta pelo Estado Brasileiro aos povos indígenas e comunidades quilombolas deste país. De fato, o RTID só foi publicado no Diário Oficial da União em setembro de 2012, exatamente 01 ano depois do que foi determinado pela Justiça Federal. A sua tardia publicação ocorreu depois que, não suportando mais o confinamento, decidimos retomar parte do nosso território tradicionalmente ocupado para garantir o Sagrado Direito à Alimentação de nossas famílias.
 
Estamos convencidos de que não cometemos nenhum crime, pois a dignidade humana está acima do direito à propriedade privada, neste caso, da terra. A nossa Constituição condicionou a propriedade privada da terra à sua função social. Mesmo assim, podemos ser condenados, segundo o despacho do juiz federal Ricardo Macieira, a pagar MULTA DIÁRIA de R$ 50.000,00 (isso mesmo, CINQUENTA MIL REAIS por dia por descumprimento do acordo que pretendeu nos confinar em fração do nosso próprio território, fazendo-nos morrer de fome), além da PRISÃO das lideranças do nosso quilombo, incluindo nossa matriarca Antonia da Silva Mendes, com 88 anos de idade.
 
Irmãos e Irmãs,
 
Não permitiremos que voltem o açoite e a chibata;
 
Não aceitaremos a condição de estrangeiros em nosso próprio chão;
 
Honraremos a luta e o martírio de Flaviano Pinto Neto, assassinado pelas mão do latifúndio, em 30 de outubro de 2010, por defender nosso território;
Honraremos a luta e o martírio dos nossos ancestrais em defesa de todos os territórios quilombolas;
 
Seguimos solidários e solidárias às lutas de todos os indígenas, quilombolas, ribeirinhos, seringueiros, pescadores, sem-terra, sem-teto… que resistem às forças da morte em todos os cantos do mundo.
 
No próximo dia 24, enquanto durar a Inspeção Judicial, hastearemos nossas bandeiras nas árvores mais altas do nosso território e faremos com que nossos tambores ecoem em todos cantos do mundo nosso canto de vivas à LIBERDADE, seguindo o mandato de Javé, o Deus dos Pobres, dos nossos Orixás, Caboclos e Caboclas e de nossos ancestrais desde a Mãe-África e a Pachamama.
 
Território Quilombola Charco-Juçaral

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