domingo, 11 de dezembro de 2016

Aonde cair morto


Aonde cair morto
 
O Francisco, vizinho de Vicente de Paula, mudou-se para uma pequena propriedade no município de Duque Bacelar. Quando inquirido sobre o porquê da mudança, ele respondeu que na Chapada, onde residia com a mulher e com as filhas, não colhia boas safras de nenhuma cultura. Francisco culpava o solo e o clima da Chapada de Buriti pelas suas agruras agrícolas e pelas suas dificuldades socioeconômicas. Demonstrava não ter nenhuma dúvida de que na propriedade, para a qual se mudaria, conseguiria desenvolver melhor suas atividades de agricultor. A falta de água na Chapada também contribuiu para a sua decisão. Ele e os amigos escavaram duas vezes um poço no qual só toparam com areia. A família se servia do poço do Vicente de Paula. No começo, carregava-se água em uma bicicleta. Depois de algum tempo, improvisou-se uma rede de distribuição de água até perto da casa do Francisco. O Vicente permitiu que eles puxassem água por reconhecer as suas dificuldades e também por precisar de alguém que morasse perto e resistisse as investidas do agronegócio. Antes de se fixar na Chapada, a família (mãe e irmãos) do Francisco não tinha onde cair morta. O Vicente convidou-os e eles passaram a ser vizinhos. A gratidão não durou muito. A mãe do Francisco se aliou ao André, plantador de soja. Pauta dos dois: depoimento contra o Vicente de Paula e a favor do André em audiência na justiça de Buriti e a troca da posse na Chapada por uma propriedade com documentação (não importava aonde). Consumou-se a troca. Pelo que se sabe, Francisco se mal diz diariamente pois quente por quente Duque Bacelar é muito mais quente que Buriti. É um terreno acidentado, enquanto que a Chapada é plana. A remuneração vem dos campos de soja que recrutam trabalhadores para catar gravetos antes do preparo da terra.  Outro dia, perguntou-se novamente por que Francisco aceitou a decisão da mãe que o levou a viver na situação que vivia atualmente. Não se respondeu ou se respondeu de outra forma: “Bastava ele ir à Chapada. Cortava umas madeiras. Vendi-as. Daria uns 300 reais. Agora nem isso.”
Mayron Régis

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