domingo, 27 de fevereiro de 2022

Por alguma razão

A sua bisavó, uma vez por mês, recebia na cozinha de sua casa um grupo de agricultores familiares que provinham dos povoados da zona rural de Governador Eugenio Barros. Eles saiam de madrugada de suas casas a fim de serem os primeiros a chegarem no órgão responsável por seus processos de aposentadoria. Aquela senhora de quase oitenta anos passava café e fritava massa de tapioca os quais serviria aos agricultores. Ela, sozinha, cozinhava para um grupo de vinte pessoas que saíram de casa sem botar nada na boca e viajaram duas horas com o propósito de resolver seus problemas previdenciários e retornar o quanto antes. Os bisnetos que acordavam no horário em que ela cozinhava o café e fritava a tapioca se perguntavam o que aquelas pessoas faziam ali tão cedo e em grande numero. Inconcebível para crianças que a vida começasse tão cedo. A bisavó acordava de madrugada todos os dias e a sua rotina compreendia vários compromissos pela casa, então aquela recepção aos agricultores fazia parte dos seus hábitos costumeiros de fazer comida e arrumar casa. O que ficou claro anos mais tarde é que a sua bisavó fornecia alimentos para aquele numero de gente como forma de ser paga com alguns cruzeiros no final dos anos setenta. Ela precisava daquele dinheiro e de qualquer outro que recebesse para comprar carne, arroz, feijão e o fumo pro seu cachimbo. Por alguma razão, ele associava aquela cena a luz de lamparina aos primeiros quadros de Van Gogh como “Os comedores de batata”. Por alguma razão...

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

Estoques de água e de carbono no Cerrado maranhense

O mundo de ponta cabeça. As espécies do Cerrado crescem para baixo. Abaixo do solo onde nada se vê e nada se escuta. Uma pequena raiz se transforma em várias pequenas raízes quese comunicam a cada milímetro que atravessam. Uma jornada árdua que leva meses e anos dependendo da espécie que o agricultor planta no solo de sua propriedade. Do plantio no solo ao cair das primeiras frutas maduras, o bacurizeiro crescerá dez anos ou um pouco mais. Tenham paciência. Cada centímetro que um bacurizeiro cresce exige uma quantidade impressionante de água e de carbono. Esses dois elementos preenchem as raízes, os caules, os galhos , as folhas e os frutos das árvores de tal forma que nem os olhos mais argutos conseguiriam visualizar onde cada elemento está presente porque esses elemntos se confundem com a própria materialidade das árvores. A água percorre o bacurizeiro por todo e qualquer lado que ele se esticar e o carbono se responsabiliza por dar ligadura aos outros elementos químicos da árvore. Despedaçar uma árvore implica em impedir a circulação de água e implica em desfazer a estrutura química que a sustentava. O que significa para o meio ambiente um bacurizeiro ou vários bacurizeiros onde água não circula mais e onde o carbono é solto para a atmosfera? Se a agua não circula mais por uma ou mais árvores essa água deixa de circular pelos espaços vitais. Se o carbono é liberado para a atmosfera ele se acopla formando estruturas químicas na atmosfera que aceleram o aquecimento do planeta. O impedimento da circulação de água e a liberação de carbono estocado não se efetiva apenas no despedaçamento de espécies como o bacurizeiro. No solo e no subsolo estão estocados toneladas de agua e de carbono e com a retirada das árvores que protegem esse solo e esse subsolo esse estoque de agua se evapora e o estoque de carbono se aglomera na atmosfera.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

Semente profunda

Na brincadeira de dizer que a base cultural e social dos maranhenses descendia dos povos indígenas que moravam no maranhão muito antes dos franceses, portugueses e africanos chegarem, ele começou a reparar nas feições das pessoas que circulavam a sua volta. Nunca tinha se dado conta o quanto os maranhenses herdaram da cultura indígena nas suas práticas sociais e quanto herdaram da genética em suas fisionomias. Não era uma questão de valorizar essa herança pelo simples ato de valorizar ainda mais valorizar por que afinal a historia e a cultura indígena foram simplesmente comprimidas em poucos minutos de aula dada em colégios públicos e privados por professores pouco qualificados nessas áreas? Essa critica deve ser entendida como superação de práticas metodológicas que levaram a sociedade brasileria a negar suas origens e supervalorizar outras culturas que aportaram em solo brasileiro em tempos mais recentes. Nada contra essas culturas mas a negação continua de suas origens praticada pelos brasileiros tem algo de deletério. O Mestre Ambrosio, banda pernambucana associada ao movimento modernista Mangue Beat, gravou em 1998 no cd “Fuá na Casa de Cabral” a musica Semen. Siba canta em determinado trecho: “como posso saber de onde venho se a semente profunda não toquei?”. A semente profunda quem plantava nos séculos XVI e XVII antes da vinda massiva de negros da Africa trazidos pelo tráfico eram os indígenas, escravizados pelos portugueses. A semente profunda tanto pode ser uma referencia aos plantios feitos pelos indígenas e mais tarde pelos negros como pode ser tambem ser uma referencia a semente profunda dentro do individuo. Os portugueses que vieram ao Brasil a partir do século XVI ansiavam por obter riquezas e enriquecer rapidamente sem construir algo sólido como se lê nesse trecho da mesma musica “Tem momentos que eu sinto que desfaço O castelo que eu mesmo levantei”. Os indígenas plantaram a semente profunda em algum ponto da historia e da realidade brasileiras. Qualquer dificuldade, eles escavam e acham. O homem branco só sonha com a semente profunda “Mas aquela semente que sonhei É a chave do tesouro que eu tenho/Como posso saber de onde eu venho/Se a semente profunda eu não toquei”.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

A modernidade em Machado de Assis e em Oswald de Andrade

Qualquer leitor de Machado de Assis aprendeu que o ponto de virada da obra machadiana de uma prosa romântica para uma prosa realista ocorreu com a publicação do livro “memórias Póstumas de Brás Cubas”. Começo do século XX, Oswald de Andrade publica memórias sentimentais de João miramar em 1924 que, claramente, faz referencia a obra de Machado cinco décadas mais tarde. Ao citar Machado de Assis em sua maior obr;a, Oswald indica quepelo menos o seu modernismo vinha de longe tanto do ponto de vista estético, como do ponto de vista geográfico e do ponto de vista histórico. Se o modernismo subverte a literatura clássica se utilizando de pastiche por que não fazer pastiche da maior obra da literatura brasileira até então? Os dois personagens principais, Bras Cubas e João Miramar, são rentistas, vivem de renda. Essa é tanto algo que os aproxima como algo que os diferencia. A renda obtida por Bras Cubas advem da escravidão. A renda obtida por João miramar advem da cotação da bolsa e mercado imobiliário. É bom frisar que Machado de Assis é um escritor moderno e não é modernista. Ele pode e deve ser lido independente da época porque as circunstancias que moldaram sua escrita e sua linguagem constinuam permeando o debate politico social do Brasil, principalemte, no quesito da hipocrisia, do trabalho escravo, do racismo velado e etc. Oswald de Andrade é um escritor modernista. Ele escreveu sobre a influencia de uma determinada época da modernidade e sua escrita está associada a modernização da sociedade brasileira decorrente da comunicação, exportação de matérias primas, importação de bens duráveis e do trabalho livre. Por essas características, infere-se a maior diferença entre a visão de modernidade de um e de outro. Machado de Assis era funcionário publico, mestiço e escrevia seus romances para funcionários públicos que residiam no Rio de Janeiro, capital do Imperio. Um autor que pensasse em viver da sua obra morreria de fome. A modernidade de Machado é marcada pela incerteza quanto a posição social e econômica de grande parte da população brasileira. A situação de Oswald como autor é bem diferente. Ele pode bancar suas produções literárias com mais segurança e facilidade do que fazia Machado de Assis e sua geração porque herdra várias propriedades. Na década de vinte, era bem mais fácil publicar livros e revistas literárias, pelo menos para alguns, do que era na segunda metade do século XIX. A modernidade de Oswald e outros artistas modernistas é marcada pela certeza de que eles estão certos quaisquer que sejam os debates. 0 comentário

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

Cedro

Se não fosse pelas informações obtidas, aquelas paisagens os tranquilizariam. Tranquilizar talvez fosse pedir ou esperar muito. As paisagens em nenhum ponto do trajeto os intimidariam. Precisavam de uma prova cabal de que corriam perigo. Tudo parecia em seu devido lugar. Onde não se via presença humana tambem parecia estar tudo ajustado. Algo, porém, não estava em seu devido lugar a partir do momento em que perguntaram para a frentista do posto de gasolina da cidade de Arari como chegariam ao povoado quilombola Cedro, município de Arari. A frentista, do lado de uma outra mulher, esclareceu o caminho: “Voces vão nessa rua direto. Atrás da igreja a rua a direita”. Ela deu um alerta: “é longe”. A fala dela os deixou desconfiados. Os amigos a quem pediram informações garantiram que o povoado se distanciava pouco da sede do município. Estranho. A frentista dava a entender a eles que melhor caçarem mais o que fazer. Impressionou-se? Ficou longe de se impressionar. No caminho, a impressão de que a visita ao povoado Cedro ocorreria num péssimo dia se fortaleceu. Um rapaz parara com sua bicicleta numa beira de campo. Pedia-se que uma criatura de Deus desse as caras para que pudessem se informar se Cedro estava longe ou perto; O jovem que levava consigo uma criança e que descansava por alguns instantes apreciando a vista dos campos forneceu mais detalhes logísticos do quanto faltava para Cedro, incluindo um pequeno detalhe: “Subirão e descerão cinco ladeiras e na ultima ladeira verão o povoado. Ainda está longe”. “Eguas, como assim, um deles pensou, melhor voltar, deixar para outro dia”. Aquelas paisagens inundavam seus olhhos e suas mentes de imaginação. Elas pertenciam a quem as cercasse. E os quilombolas lutavam contra as cercas e contra os pistoleiros que assassinavam suas lideranças. Enfim, chegaram em Cedro, onde pistoleiros assassinaram várias lideranças, e concluíram que as pessoas queriam mesmo que não dirigissem o carro pelos campos que circundam a comunidade, os campos que motivam os conflitos entre as comunidades quilombolas e os fazendeiros.A própria comunidade do cedro os recebeucom indiferença “mais um que vem aqui e nada se resolve”.

domingo, 6 de fevereiro de 2022

Astolfo Marques

O nome Astolfo marques se perdeu nas brumas do tempo. Escutou seu nome pela boca de uma historiadora que enfatizava o embate dele com o escritor Antonio Lobo no inicio do século XX. Astolfo Marques escreveu crônicas sobre o Maranhão pós abolição que o pesquisador Matheus Gato relançou recentemente na forma de livro impresso. É bem capaz que o tempo limpe as brumas e Astolfo Marques reapareça com os mesmos trajes que usava ao frequentar a Academia Maranhense de Letras. Entrar no mérito dos embates entre Astolfo Marques e Antonio Lobo não vem ao caso. Nem é possível tomar o partido de Astolfo Marques. A historiadora de tanto falar mal de Antonio Lobo o influenciou sobremaneira. Melhor comentar o nome cuja pronuncia o torna incomum. Numa cidade que faz um esforço incomensurável para apagar suas memorias escritas e orais, o nome Astolfo marques conseguiu a façanha de não ser apagado como comprovam as conversas com a historiadora e a publicação recente de suas crônicas. E como comprova a descoberta de que o nome Astolfo Marques foi inscrito na placa de identificação de uma rua no bairro Apeadouro. A recente descoberta ocorreu devido as conversas e ao livro publicado porque graças a essas circunstancias pôde ler o nome e aperceber-se de quem se tratava. Esses fatos se desenrolaram em um pouco menos de dois anos o que é um feito notável visto que Astolfo Marques era um escritor e intelectual maranhense e negro. Sempre são notáveis aqueles movimentos e aquelas expressões artísticas e culturais que superam ou procuram superar estruturas cujas funções socioeconômicas decorrem justamente da negação desses movimentos e dessas expressões. O Maranhão mudou quase nada com a abolição da escravatura e a proclamação da republica, eventos separados por um ano e meio de tempo cronológico. Separados no tempo e separados na forma como se deram. Princesa Isabel assinou a lei Aurea. Deodoro da Fonseca empunhou uma espada. As narrativas de Astolffo Marques, ao seu modo, unem esses dois momentos. Na escrita, a união é possível. A rotina diária da republica desfaz qualquer pretensão de unidade.

sábado, 5 de fevereiro de 2022

Os vencedores de plantão

Ele se deu conta. O vizinho só rolava musica sertaneja faz horas. Admirou-se de quantas musicas sertanejas tocaram. Com certeza, o individuo não era eclético. A não ser que considerasse eclético escutar sertanejo das mais variadas cores e origens. Raciocinou um pouco e encontrou a resposta. O vizinho se via como o protótipo do agricultor empresário figura bem quista em qualquer lugar onde os negócios o chamavam. Pela manhã, conversara com um amigo o tamanho do constrangimento que sentia ao por os pés em cidades do sul do maranhão assoberbadas pelo agronegócio da soja. Em várias cidades do Maranhão, o agronegócio da soja reinava quase absoluto. Onde o agronegócio não reinava absoluto e s vezes nem reinava isso acontecia porque as comunidades tradicionais e quilombolas se insurgiram contra o avanço. Insurgir-se contra algo leva a pensar em violência física. Nem sempre é. insurgir-se contra algo pode ser também um ato de rebelião cívica, um questionamento que põe a prova um projeto que reivindica benefícios pra a sociedade e que no fundo esconde muitos malefícios. Um questionamento desvenda algo mal explicado. Na avenida beira mar, uma das principais avenidas de São Luis, um monumento em homenagem a alguma figura histórica se ergueu. De maneira geral, a sociedade faz a mínima ideia de quem se trata a tal figura. “Você sabe quem é esse sujeito?”, perguntou a mãe. “Almirante Barroso, venceu a batalha de Riachuelo, guerra do Paraguai”. A resposta encerraria o assunto se quem respondeu parasse de raciocinar. Ele continuou a raciocinar. Qual razão levar a o município de São luis ou quem quer que seja a erguer aquele monumento de um almirante que venceu uma batalha pouca falada pouco comentada numa cidade que dá a mínima para os seus recursos hídricos? São Luis era uma cidade que homenageava santos católicos, escritores, políticos, intelectuais, militares e figuras europeias relacionados com a sua historia. Homenagear índigos e negros nem quando morrem. Tocar sertanejo homenageia os atuais vencedores de plantão: o agronegócio.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2022

Segurança alimentar e quilombos

Uma amiga pediu que escrevesse um breve texto que tocasse no tema segurança alimentar. Escreveu o texto com uma visão mais discursiva, menos concreta. Na hora da escrita não veio a mente nenhum exemplo concreto e exemplos concretos na temática sobravam pela realidade das comunidades tradicionais do Maranhão. A problemática da segurança alimentar se refere a situação em que pessoas tem dificuldade de ingerirem alimentos que garantam o seu bem estar e a sua produtividade durante o dia. A sociedade maranhense em termos econômicos e sociais se desenvolveu com base na monocultura e no trabalho escravo. Essa definição, por conta dos vários solavancos experimentados pela economia do Maranhão no século XIX, tem nuances que se relacionam com a questão d segurança alimentar. Os quilombos eram formados por negros que fugiam das fazendas só que isso não quer dizer que os quilombolas se mantivessem avessos a qualquer contato com os fazendeiros da região onde o quilombo ou os quilombos se formaram. Uma das prováveis causas de fuga de negros escravos dizia respeito a alimentação. Os fazendeiros cobravam trabalho sem descanso e entregavam pouca alimentação para os negros. Essa dificuldade dos fazendeiros de fornecer alimentos para os seus escravos comprova o quanto a base econômica e produtiva da sociedade maranhense baseava na monocultura, na escravidão e na miséria. Um caso celebre de como os fazendeiros se comportavam com relação aos seus escravos aconteceu na fazenda Santa Cruz, município de Buriti, Baixo Parnaiba maranhense, na década de 70. É uma prática corriqueira jogar farinha ou arroz ou os dois juntos numa panela repleta de gordura animal ;para fazer uma farofa que encherá a barriga. Esse caso relatado não é de escravos e sim empregados. Empregados mais pelo fato de que a escravidão fora abolida em 1888 pela princesa Isabel porque se você observar direitinho eram quase escravizados pelos proprietários da fazenda Santa Cruz. Toda a vez que o proprietário jantava sozinho e sobrava gordura nas panelas, as cozinheiras negras jogavam arroz e farinha porque com isso elas podiam incluir proteína animal na sua dieta diária. Agora, se a esposa do proprietário resolvesse jantar com o marido o negocio pegava porque a dona enchia de água as panelas evitando que as cozinheiras seguissem com seus planos. Então, para alguns era muito melhor tirar pra fora e ir morar num quilombo do que ficar numa casa onde arcam seu couro e nem dão comida que preste.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2022

Conversas a três

As conversas giravam e giravam pelas mesas em que os três conhecidos se sentaram. Uma das conversas girava em torno do tema da politica. Em quem você votará daqui a nove meses? “Quem tem dinheiro é que vence a eleição. Na minha cidade, São João Batista, baixada maranhense, rola desse jeito. Um chega dá tanto, vem outro e cobre o valor dado pelo candidato adversário”. Nunca fora a São Batista, lugar que produz desembargador e outras figuras que mandaram e mandam no Maranhão por décadas. O que tem em São João Batista de interessante? “Porra nenhuma”, respondeu quem lá não morava e nem morou. “São João Batista é uma cidade formada por pântanos (mais conhecidos por campos naturais). Isso é o que tem em São :Joao Batista”, respondeu quem lá morou e cuja vida atual se associava a vida cultural e artística de São Luis. Ele recordou dos tempos em que junto com os amigos tocava em igrejas por toda a cidade e do dia em que andando pelas palafitas do bairro da Liberdade caíram de uma ponte precária em cima da lama porque acreditaram na conversa de um sujeito que garantiu que a ponte era segura. O que eles faziam tão pra dentro da Liberdade? Procuravam pelo boi de Leonardo, boi de zabumba, cuja batida se escutava de longe.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2022

debate modernista

A função do historioador é muito maior que somente narrar um fato ou escrever a Historia como se supõe que ela realmente aconteceu. É um pouco isso, mas também cabe ao historiador apresentar novas interpretações de fatos já discutidos. O historiador de arte Rafael Cardoso , em seu livro Modernidade em preto e branco: Arte e imagem, raça identidade no Brasil , 1890 desenvolve o argumento que o modernismo estético brasileiro não foi única e exclusivamente o modernismo paulista da semana de arte moderna de 1922. Ele tambem arrola informações que contestam a visão de um modernismo elitista que se vincularia as artes plásticas, a musica clássica e a produção literária de romance , poesia e manifestos. No entender de Rafael Cardoso, outros modernismos surgiram antes da e durante a semana de arte moderna. Quis se sestablecer a semana de 22 como um marco da produção intelectual, cultural e artística do Brasil. Para muitos, a produção anterior pouco mereceria analise critica. O que sobraria para essa produção anterior se atrelaria a designação “Pré Modernismo”. Na verdade, os paulistas disputavam com os cariocas a hegemonia cultural num pais cuja produção ainda era incipiente tanto em qualidade como em quantidade. A cidade so Rio de Janeiro, capital das Republica Federativa do Brasil, deixava pouco a desejar em sua produção em diversas áreas como literatura, teatro, artes gráficas, musica e etc. Os trabalhos empreen;didos por artistas e intelectuais pretendiam ser nacionais o que logo se verificou que não eram porque a sua narrativa privilegiava o espaço urbano carioca. Em parte, a revolta dos paulistanos expressa na semana de arte moderna e em outros eventos artísticos e culturais procurava desvendar um outro pais que os artistas e intelectuais ligados ao Rio de Janeiro dificilmente tinham contato. É verdade que a produção dos artistas cariocas nada avançou quanto a compreensão de um pais que acabara de abolir a escravidão e que acabara de ver o seu imperador se exilar na Europa, mas tambem é verdade que a produção dos artistas paulistas se calava frente a situação social vivida pela maior parte da população brasileira, especialmente pelos povos indígenas, pelos negros libertos e pelos brancos pobres. Tanto a produção artística carioca como a produção artística dos paulistas excluíram o restante do Brasil de suas perspectivas de curto, médio e longo prazo. Rafael Cardoso revela em seu livro que a revista carioca Kosmos, que publicava textos literários no começo do século XX, publicou um artigo em 1904 do etnólogo Nina Rodrigues em que ele tratava da escultura popular de matriz afro-brasileira como “belas-artes”. Conclui-se logo “Que ótimo”. Ótimo em termos. Relacionar belas artes e cultura africana deve ter soado o alarme numa sociedade excludente e avessa a cultura que nem era e é a brasileira. E os senhores da cultura se perguntaram “Queremos que a nossa arte venha a ser relacionada com os negros?”. A exclusão se deu com a pouquíssima divulgação e discussão do texto de Nina Rodrigues em mais de cem anos de sua publicação.