O Programa Territórios Livres do Baixo Parnaíba (Comunidades do Baixo Parnaíba e Fórum Carajás)
terça-feira, 1 de dezembro de 2020
O mercado das Tulhas e o mocotó
A chuva aproximou as pessoas que almoçavam na parte interna do Mercado das Tulhas. As nuvens escuras se aglomeraram por sobre o centro de São Luis no final da manhã de segunda feira. Quem parava para ver as nuvens, logo duvidava que delas saísse uma gota de água ou se saísse seriam poucas. Mãe e filha (negras) pediram mocotó e fígado para almoçarem ao redor de uma mesa de madeira. Além delas duas, havia um casal nesse mesmo restaurante. O dono do restaurante (o Deco) saira com a intenção de entregar quentinhas. A sua esposa e uma assessora cozinhavam e recepcionavam os clientes. Elas foram rápidas na cozinha e, dentro de vinte minutos, servia-se o mocotó e o fígado. E veio a chuva. A mãe não esperou os pingos aumentarem e mudou-se de mala e cuia para debaixo das telhas do mercado. A filha assegurava que a chuva não passaria de um chuvisco. A chuva não esmoreceu por vários minutos. De pertinho, dava para ver o que cada uma comia. A senhora comia o mocotó e a moça comia o fígado (em determinado momento comentou que fígado só prestava bem quentinho). A conversa das duas se arrastava por um mercado que não existia mais: “Será que ainda se vende carne de cutia e carne de paca por aqui?”. Não se vendia mais esse tipo de carne nem ali e nem outro mercado de São luis então, provavelmente, aquela senhora botara os pés no Mercado das Tulhas numa época em que as populações ludovicense e de cidades vizinhas (Alcantara, Paço do Lumiar, Ribamar e Raposa) consumiam pouca carne de gado e para suprir suas necessidades de proteína apegavam-se a carne de caça e mariscos. O mercado das Tulhas não vendia mais carne de caça, mas continuava vendendo camarão. Ela se recordava de caminhar do hospital Djalma Marques (Socorrão) ao mercado e comprar camarão para seus colegas almoçarem. Devia ser anos 80, numa cidade de São Luis com poucos recursos financeiros e com muita fome de comer e viver. Quarenta anos passados, ela traçava um mocotó num mercado bem diferente do que vivenciara e com a filha a tiracolo.
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