A dona Rita zanzava pela cozinha
da casa. A maior parte das pessoas continuava dormindo nos quartos, em redes ou
em camas. O dia amanhecera encoberto devido as chuvas da noite anterior,
especialmente a chuva que varrera a Chapada pela madrugada. As pessoas
acordavam e o sol não conseguia romper as barreiras criadas pelo tempo. O sono
foi bom, respondiam a quem perguntava. Dona Rita juntara as cascas de bacuri
que jaziam sobre o solo da Chapada e levara-as para longe do terreiro. A cozinha
ficava num puxadinho atrás da casa. Neste puxadinho, é claro, cozinhava-se, num
fogão rústico a base de carvão produzido pela família, mas também se sentava em
volta da mesa para o café da manhã, para o almoço e para o jantar. Nesse espaço
cozinhava-se vários tipos de conversa. A Simone, cidadã alemã, sentou-se em uma
das cadeiras e perguntou a dona Rita se, por um acaso, ela trazia consigo a genética
indígena. A dona da casa se encabulou com a pergunta e não respondeu. Vicente
de Paula, marido de Dona Rita, respondeu que todos de uma forma ou de outra
carregavam sangue indígena. Mayron Régis, jornalista e amigo da família,
lembrou de uma fala de Dona Rita há alguns anos atrás depois de uma visita a
comunidade de Matinha. Ele a conhecia desde 2011 e ela dificilmente se
pronunciava nos assuntos relativos a briga que a sua família travava contra os
Introvini. O Vicente era o cabeça da família e, portanto, tudo que dizia e
fazia era ponto final. Então, numa conversa dentro do carro, ela interveio como
não fizera antes. Questionava os Introvini o porquê destes quererem tirar ela e
seus familiares da terra onde moravam. Naquele instante, Mayron sacara que a forma
de expressar de dona Rita provinha de outros tempos e de uma outra cultura (não
a portuguesa, não a africana e sim a indígena) e por mais que ela não tivesse consciência
disso esses elementos se faziam presentes.
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